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Vila na Nigéria transforma cupins em proteína com mulheres caçadoras

Em noites tropicais, quando as primeiras chuvas chegam ao sudoeste da Nigéria, uma cena curiosa se desenrola. Milhares de mulheres se reúnem armadas com lanternas, bacias de alumínio e redes improvisadas. O objetivo? Capturar cupins alados, conhecidos como “esunsun” pelos iorubás, que se transformarão em um dos petiscos mais consumidos do país.

Essa prática pode parecer exótica para muitos, mas é parte de um sistema alimentar ancestral que se mostrou eficaz, sustentável e nutritivo. Com a crescente discussão global sobre proteínas alternativas, a Nigéria já possui uma longa tradição baseada em insetos comestíveis, onde as mulheres são as protagonistas do processo, desde a coleta até a venda.

Cupins comestíveis: uma proteína alternativa da África

Para muitos que são de fora, o termo pode soar estranho, mas o consumo de cupins é algo comum em vários países africanos. Na Nigéria, especialmente no sul e sudoeste, as comunidades se mobilizam durante a estação chuvosa, quando os cupins surgem em grandes quantidades atraídos pela luz. É um verdadeiro evento, onde mulheres e crianças saem com lanternas e bacias para capturá-los, aproveitando a facilidade com que os insetos são atraídos.

O processo é simples: os cupins, voando desordenados, acabam colidindo com superfícies brilhantes. É fácil apanhar com as mãos ou com peneiras improvisadas. Em questão de horas, centenas de gramas de cupins são coletados, limpos, secos e preparados. Eles são vendidos nas feiras locais ou consumidos imediatamente. A espécie mais comum encontrada é a Macrotermes bellicosus, considerada uma das mais saborosas entre os insetos.

Perfil nutricional e uso medicinal dos cupins alados

Os cupins comestíveis são verdadeiros tesouros nutricionais. Estudos mostram que esses insetos contêm:

  • Alta concentração de proteína (entre 35% e 45%)
  • Aminoácidos essenciais
  • Ferro, zinco, cálcio e fósforo
  • Vitaminas do complexo B
  • Baixo teor de gordura saturada

Além de serem nutritivos, os cupins têm um papel importante nas práticas medicinais tradicionais em algumas comunidades, como entre os iorubás e igbo. Acredita-se que esses insetos:

  • Podem ajudar na saúde pulmonar, especialmente no tratamento de asma
  • Aceleram a cicatrização de feridas
  • Apoiam gestantes que enfrentam anemia ou fraqueza
  • Fortalecem o sistema imunológico de crianças e idosos

Esses conhecimentos são passados de geração em geração e, mesmo sem validação científica, são parte da cultura e saúde de diversas comunidades na Nigéria.

Alimentação tradicional e caça de insetos: herança cultural africana

A alimentação tradicional na Nigéria é profundamente conectada ao meio ambiente, valorizando cada recurso disponível. A prática de caçar insetos para alimentação é uma tradição de séculos, especialmente entre grupos como os iorubás, ibibios e tivs.

Curiosamente, essa prática, que antes era vista apenas como uma forma de sobrevivência, agora ganha destaque mundial como um exemplo de sustentabilidade alimentar. Comparando com a carne bovina, os cupins precisam de 99% menos água, 90% menos área e emitem muito menos gases de efeito estufa.

Além disso, a coleta é feita de maneira artesanal, sem necessidade de armamento ou tecnologia avançada, quase sem impactar o meio ambiente.

Mulheres na agroindústria de insetos: um protagonismo silencioso

Um aspecto fascinante dessa prática é o papel das mulheres. Em muitas vilas, são elas que lideram a coleta, o preparo e a venda dos cupins. Esse trabalho começa à noite e vai até as primeiras horas da manhã, aproveitando o momento em que os insetos aparecem em massa.

A coleta evolui para uma verdadeira atividade semi-industrial em casa: os cupins são limpos, secos ao sol ou levemente torrados, depois temperados e preparados para a venda. Isso cria uma rede de pequenas empreendedoras, trazendo não só renda, mas também autonomia financeira e status social dentro da comunidade. Embora os registros sobre essa dinâmica sejam escassos, é claro que a produção de insetos comestíveis na África é marcada pela presença feminina, semelhante ao que ocorre em algumas tribos indígenas da Amazônia.

Exportações e novos mercados: o cupim nigeriano no radar global?

Nos últimos tempos, o interesse por proteínas alternativas cresceu, e várias empresas na Europa e na Ásia começam a explorar o potencial dos insetos comestíveis. Embora a Nigéria ainda não tenha exportações significativas, iniciativas locais buscam transformar a coleta artesanal em uma microindústria certificada.

ONGs e universidades estão testando métodos de produção em escala controlada, incluindo a criação de cupins em viveiros e estabelecendo padrões sanitários. A ideia é viabilizar a venda legal de cupins como snacks saudáveis, farinha proteica ou ingredientes em bebidas energéticas e alimentos infantis.

Esse é apenas o começo de uma transformação que pode levar o “esunsun” das comunidades locais para prateleiras de supermercados ao redor do mundo, sem perder suas raízes culturais e ecológicas.

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