Filho que cuida dos pais idosos pode exigir rateio de irmãos

Cuidar dos pais idosos é um assunto que toca muitos corações e, ao mesmo tempo, é uma fonte de conflitos nas famílias brasileiras. Em muitos lares, um filho acaba assumindo praticamente toda a responsabilidade financeira e emocional para que os pais tenham uma vida digna, enfrentando despesas com saúde, alimentação e moradia. Essa situação pode ser bastante desgastante.
No entanto, o Código Civil brasileiro, especificamente no seu artigo 1.696, deixa bem claro que o dever de prestar alimentos é algo recíproco. Isso quer dizer que todos os filhos devem cuidar dos pais, e se um deles está arcando sozinho com a responsabilidade, ele pode sim procurar a Justiça para exigir que os irmãos contribuam de acordo com a capacidade de cada um.
O que diz a lei sobre a obrigação alimentar entre parentes
De acordo com o artigo 1.694, parentes podem se solicitar mutuamente os alimentos necessários para viver de uma forma que condiga com suas condições sociais. O artigo 1.696 complementa que o direito à prestação de alimentos também é recíproco entre pais e filhos. Isso significa que os filhos têm a obrigação legal de sustentar os pais idosos quando estes não conseguem se manter sozinhos.
Essa responsabilidade é dividida de forma proporcional. Filhos que possuem mais recursos devem contribuir mais, enquanto aqueles que têm menos poderão colaborar na medida do possível.
Jurisprudência confirma rateio proporcional entre irmãos
Diversos tribunais já firmaram esse entendimento. Um exemplo disso é uma decisão de 2023 do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que garantiu a um filho que arcava com todos os custos médicos da mãe idosa o direito de cobrar dos irmãos a contribuição proporcional. Também, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) aceitou que o filho que se sobrecarrega pode entrar com uma ação regressiva contra os irmãos que não estão ajudando, com base no princípio da solidariedade familiar.
Como funciona a cobrança judicial contra irmãos omissos
Se um filho está cuidando só dos pais, ele pode abrir uma ação de alimentos em nome deles, listando todos os irmãos como corresponsáveis. O juiz, então, irá analisar a necessidade dos idosos e a capacidade financeira de cada filho para definir quanto cada um deverá pagar.
É possível também fazer uma ação de regresso, onde o filho que já pagou as despesas pode solicitar a devolução do que gastou a mais, desde que prove que arcou sozinho com os custos e que havia necessidade.
Exemplos práticos de decisões judiciais
Um caso emblemático de 2022 no TJ-MG condenou dois irmãos a ajudarem com as despesas médicas e de cuidado da mãe idosa após um terceiro filho conseguir demonstrar que estava pagando todas as contas. O tribunal deixou claro que “cuidar dos pais não é uma escolha, é um dever legal”.
Outro julgamento do TJ-RS confirmou o direito de um filho que gastou mais de R$ 30 mil com a saúde do pai, permitindo que ele cobrasse metade desse valor dos irmãos que, mesmo tendo condições, não colaboraram.
Especialistas ressaltam o princípio da solidariedade familiar
Para a professora de Direito Civil, Maria Berenice Dias, cada filho deve compartilhar a responsabilidade de cuidar dos pais idosos. Ela afirma que a omissão de um filho pode ser corrigida judicialmente, já que constitui um descumprimento do dever legal e moral.
O advogado de família, Rolf Madaleno, complementa que “não há espaço para transferir toda a carga a um único filho. A solidariedade familiar é um dos pilares do Direito brasileiro, e a jurisprudência reforça essa ideia”.
Impacto social e emocional do rateio obrigatório
A possibilidade de cobrar judicialmente os irmãos que não ajudam não só alivia a carga financeira do filho que cuida sozinho, mas também reforça que a responsabilidade pelos pais idosos é algo que deve ser compartilhado. Essas decisões judiciais ajudam a evitar futuras disputas patrimoniais, pois deixam claro quem contribuiu e quem se omitiu no cuidado.
Justiça reforça que nenhum filho pode se omitir
Em resumo, as decisões dos tribunais transmitem uma mensagem importante: cuidar dos pais idosos não é um favor, é um dever legal. O filho que se sacrifica sozinho tem todo o direito de exigir que os irmãos façam sua parte, seja contribuindo para despesas atuais, seja reembolsando gastos passados.
A Justiça tem reconhecido que permitir que alguns filhos se omitam enquanto outros carregam o peso da responsabilidade quebraria o princípio da solidariedade familiar. Assim, todos respondem de acordo com sua capacidade, garantindo que os direitos dos idosos sejam respeitados e que a carga seja dividida de forma justa.