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Cidade dos Mortos no Egito: túmulos ocupados por moradores

A Cidade dos Mortos, ou Al-Qarafa, é uma das áreas mais inusitadas do Cairo, no Egito. Este cemitério que já pertenceu a uma necrópole islâmica do século VII hoje abriga entre 500 mil e 1 milhão de pessoas. Essas comunidades transformaram túmulos e mausoléus em verdadeiros lares. É impressionante, não?

No meio de lápides e monumentos históricos, encontramos famílias inteiras que vivem, trabalham e criam seus filhos. O que antes era um lugar dedicado à dor e à memória agora se tornou um bairro vibrante com escolas, mercadinhos e até cafés. É um lugar que desafia nossa noção sobre a separação entre a vida e a morte.

Como surgiu a Cidade dos Mortos

A história da Cidade dos Mortos começa com a fundação do Cairo islâmico, quando sultões e nobres ergueram mausoléus grandiosos para suas famílias. Esses espaços, muitas vezes com pátios internos, eram utilizados temporariamente por familiares em luto, uma tradição que poderia durar até 40 dias.

Com o passar dos anos, zeladores e guardiões dos túmulos começaram a residir ali de forma permanente. Na década de 1970, a situação no Cairo se agravou com o crescimento populacional e a escassez de moradia. Isso fez com que novas famílias, especialmente de baixa renda e migrantes rurais, se mudassem para o local, adaptando as estruturas funerárias.

Atualmente, é comum ver casas com antenas de TV sobre os túmulos e crianças brincando entre as lápides. Tudo isso reflete a grave crise habitacional que assola o Cairo, que já tem mais de 20 milhões de habitantes.

A vida cotidiana entre os túmulos

Apesar do cenário peculiar, a vida na Cidade dos Mortos flui de maneira bastante normal. Os moradores, por exemplo, convivem com os mortos de uma forma natural e respeitosa. Muitos destacam que a comunidade é tranquila, solidária e até mais segura do que outras áreas da cidade.

Dentro da necrópole, já existem pequenos comércios, escolas e mesquitas. Eles criaram um sistema informal de vizinhança, onde todos se conhecem e seguem algumas regras de convivência. Porém, a infraestrutura é bem precária. A falta de saneamento básico, o acesso irregular à água potável e a eletricidade improvisada são desafiadores para muitos.

Para a maioria, a vida entre os túmulos é uma questão de sobrevivência. O aluguel é baixo, e a proximidade do centro da cidade torna essa opção acessível em um Cairo que se tornou um lugar caro para muitos.

Projetos de modernização e remoções forçadas

Desde 2021, o governo egípcio iniciou projetos de expansão urbana e construção de rodovias que afetam diretamente a Cidade dos Mortos. Essas obras, apresentadas como parte da modernização do Cairo, têm como consequência a demolição de túmulos históricos e o despejo de residentes.

Críticos argumentam que essas intervenções ameaçam o patrimônio cultural do Egito e a memória arquitetônica islâmica da capital. Entre os monumentos afetados, estão mausoléus da era otomana e túmulos de figuras importantes da dinastia de Maomé Ali.

Embora o governo prometa a realocação dos moradores e a preservação de estruturas significativas, o processo é marcado pela falta de transparência e denúncias de remoções sem aviso prévio. Organizações internacionais estão preocupadas com a perda irreversível deste patrimônio único no mundo árabe.

Um símbolo do contraste social no Cairo moderno

A Cidade dos Mortos é um forte símbolo da resiliência e da desigualdade social no Egito. Em meio a mausoléus centenários, vivem famílias que representam as faces mais vulneráveis da sociedade.

O contraste entre o luxo das novas avenidas e as moradias improvisadas na necrópole evidencia a tensão entre desenvolvimento urbano e exclusão social. Para muitos egípcios, este espaço reflete a desigualdade que persiste no país, mostrando a dura realidade de pessoas que não têm moradia digna, mas convivem diariamente com a história encapsulada em seus mortos.

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