ONU aponta risco de nova lei brasileira para a Amazônia e povos indígenas

O Brasil vive um momento decisivo em relação à sua política ambiental. Com a COP30 se aproximando, a pressão aumenta sobre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele tem até 8 de agosto para decidir se sanciona ou veta um novo projeto de lei de licenciamento ambiental. Esse projeto aprovado pelo Congresso pode ser um passo atrás nas ações de proteção do meio ambiente e abrir as portas para um desmatamento em larga escala na Amazônia.
A relatora especial da ONU para Direitos Humanos e Meio Ambiente, Astrid Puentes Riaño, não poupou críticas. Em uma conversa com veículos de comunicação, ela disse que essa proposta é um “retrocesso de décadas”, alertando sobre os riscos sérios que isso pode trazer para a Amazônia e outras regiões cruciais para o meio ambiente. Segundo ela, sem uma análise detalhada, a continuidade de projetos pode resultar em desmatamento na floresta.
18 milhões de hectares sob ameaça
Dados do Instituto Socioambiental (ISA) indicam que a nova lei pode acabar retirando a proteção de cerca de 18 milhões de hectares de floresta. Para ter uma ideia do tamanho desse impacto, isso equivale ao território inteiro do Uruguai. As preocupações giram em torno da possibilidade de que a flexibilização das regras de licenciamento facilite a expansão de práticas como mineração e agricultura, até mesmo em áreas que a legislação atual protege.
Um dos pontos mais polêmicos do projeto é a ideia de licenciamento automático. Com isso, os órgãos ambientais teriam prazos de até 12 meses para se posicionar sobre um projeto. Se esse tempo passar sem resposta, a licença poderia ser dada automaticamente. Muitos especialistas apontam que essa medida pode permitir que empreendimentos que geram impactos significativos avancem sem a análise crítica que a situação exige.
Menos consultas e menos controle
Outro aspecto que preocupa é a diminuição das consultas a comunidades indígenas e quilombolas. Com a nova proposta, apenas aqueles que são diretamente afetados precisariam ser consultados. Isso, segundo a ONU, pode excluir muitas comunidades das decisões que impactam suas vidas e territórios. Além disso, a proposta incentiva que pequenos empreendimentos agropecuários sejam responsabilizados por seus próprios impactos ambientais com formulários simples online, o que pode enfraquecer a fiscalização, especialmente em regiões onde o desmatamento ilegal já é uma realidade.
Astrid Puentes enfatiza que projetos de grande escala, como mineração ou infraestruturas, não podem ser autorizados sem uma análise completa do seu impacto ambiental. A proposta, tal como está, deixa brechas preocupantes para essa fiscalização.
Desmatamento em alta e seca extrema
A situação atual é ainda mais alarmante. Monitoramentos por satélite mostraram que o desmatamento na Amazônia está em alta, com grandes áreas sendo atingidas por queimadas, agravadas pela seca que o Brasil enfrentou em 2024. Essa combinação de destruição florestal e falta de água já tem efeitos diretos sobre a saúde das populações locais e o clima global.
Organizações da sociedade civil, como o Observatório do Clima, afirmam que a nova legislação atende, sobretudo, a interesses do agronegócio e da mineração, que vêm pressionando por uma redução da burocracia ambiental.
Por outro lado, quem defende o projeto argumenta que ele vai “modernizar” o sistema atual, considerado ineficiente. Para esses defensores, um novo modelo traria agilidade para empreendimentos considerados essenciais, como construção de estradas e usinas.
Governo dividido e pressão internacional
Dentro do governo, o clima é de divisão. A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, já manifestou sua contrariedade a vários pontos do projeto. Ela acredita que, se a lei for aprovada sem modificações, pode ser contestada no Supremo Tribunal Federal (STF).
Recentemente, em um evento em Brasília, Marina declarou que a equipe do governo está considerando um veto parcial e a criação de uma alternativa legislativa mais equilibrada. “Não basta vetar. É preciso ter algo para apresentar em troca”, afirmou a ministra. A ideia é preservar os aspectos técnicos positivos do projeto, enquanto se elimina o que pode ameaçar a floresta e os direitos humanos.
A decisão do presidente ocorre em um cenário delicado, especialmente com a COP30 marcada para novembro em Belém (PA). A aprovação de uma lei que fragilize as proteções ambientais pode vir acompanhada de críticas internacionais e prejudicar a imagem do Brasil como uma nação que busca liderar a agenda ambiental global. Se Lula optar pelo veto, o Congresso ainda terá a opção de derrubá-lo e manter a proposta original. Portanto, o desenrolar dessa história ainda está longe de ser definido.