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O caso de feitiçaria de 1754 em Jundiaí, Brasil

Em 1754, Jundiaí viveu um episódio curioso e, para muitos, impactante. Mãe e filha, Thereza Leyte e Escholástica Pinta da Silva, foram acusadas de bruxaria. O motivo da denúncia? O suposto uso de feitiços para causar a morte do marido de Escholástica, Manoel Garcia, que havia falecido oito anos antes. Essa história foi reconstituída pela filóloga Narayan Porto, da USP, em sua dissertação.

Curiosamente, as acusações não vieram da comunidade em geral, mas de parentes de Manoel. O que movia essa denúncia era, na verdade, o interesse nos bens deixados por ele, especialmente os indígenas que ele mantinha como escravizados. A disputa por herança em tempos tão conturbados levou essas mulheres a serem apontadas como bruxas.

Além da trama familiar e de bens, um personagem que não pode ser esquecido é Francisco, um homem negro escravizado. Ele foi testemunha de acusação e, segundo documentos do processo, espalhou boatos de que Escholástica teria causado feridas no marido apenas ao tocá-las, além de, supostamente, deixá-lo cego com suas mãos.

É importante lembrar que o Brasil colonial vivia sob a sombra da Inquisição Portuguesa, que começara em 1536. Embora seu foco principal eram os cristãos-novos, acusar alguém de feitiçaria era uma prática muito comum. Se os casos eram considerados graves, poderiam ser levados a Lisboa para julgamento formal pelo Tribunal do Santo Ofício.

No entanto, a história das “bruxas de Jundiaí” teve um desfecho distinto. O processo não seguiu para Lisboa. Ao invés disso, foi decidido localmente, e as autoridades concluíram que as provas eram insuficientes para condenar Thereza e Escholástica. Assim, elas escaparam de punições mais severas.

Mas o desfecho não foi totalmente favorável. Francisco, que havia denunciado as mulheres, foi punido publicamente. O pai de Escholástica, um juiz local, o açoitou em uma demonstração de autoridade, sob a justificativa de que ele caluniara sua própria família.

Esse episódio ilustra como, em tempos de poder desigual, as disputas por bens e status social podiam transformar a Justiça e a religião em armas de controle. Um lembrete sombrio de que, muitas vezes, o peso da história recai sobre aqueles que têm menos poder para se defender.

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