Filho usa usucapião e garante imóvel, deixando irmãos sem herança

Um herdeiro que fica na casa dos pais e cuida do imóvel, sem que os irmãos se oponham, pode conquistar a propriedade total através da usucapião especial urbana. Com isso, ele pode até excluir os irmãos da herança, um cenário que pode ser surpreendente para quem não conhece bem o assunto.
Esse direito está previsto na Constituição Federal e no Estatuto da Cidade, que permitem a transferência da posse quando uma pessoa ocupa um imóvel urbano de até 250 m² por cinco anos seguidos, com a intenção de morar lá e sem ser dono de outro imóvel. Para garantir esse direito, é necessário que a ocupação seja feita de forma pacífica e sem contestação.
Usucapião especial urbano: requisitos e limites
Para que a usucapião especial urbana seja válida, o ocupante deve residir no local, não pode ter outro imóvel e a área do imóvel não pode ultrapassar 250 m². Além disso, é importante que a posse seja tranquila, mostrando um comportamento típico de proprietário. O pessoal da Justiça costuma valorizar evidências de que a pessoa cuidou do imóvel, pagou despesas como IPTU e realizou manutenções, o que indica sua intenção de ser o dono.
Tem também os casos em inventários, onde o herdeiro que ocupa o imóvel pode reivindicar a usucapião conforme o Código Civil, que pode ter regras e prazos diferentes. No fundo, o que conta é a posse contínua e sem oposição, combinada com ações que demonstrem domínio.
Quando a Justiça reconhece a perda da fração dos irmãos
Os tribunais têm afirmado que irmãos coproprietários podem perder sua parte se não reagirem a uma ocupação exclusiva que se prolonga no tempo. Um exemplo trazido pelo advogado João Victor Duarte Salgado mostra que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que um dos irmãos ficou quieto por 15 anos, enquanto um deles morou sozinho na casa, cuidou dela e pagou os impostos.
Nesse caso, o advogado comentou: “O filho ficou morando no imóvel, pagou os impostos, manteve o bem e fez melhorias, morando como se fosse dono, sem oposição dos irmãos. Então, nesse período, ele passou a ter o período aquisitivo de usucapião.” Essa situação serve de alerta para que os coproprietários fiquem atentos e não deixem a posse ser assumida por um único irmão.
Como evitar a usucapião dentro da família
Se o objetivo é minimizar o risco de perder parte da herança, o ideal é registrar por escrito o uso do bem comum. João Victor destaca que “acordo verbal, mesmo entre irmãos, não vale; a ideia é colocar tudo no papel”. Sugestões úteis incluem acordos como comodato, cessão gratuita de uso ou um contrato de locação, dependendo da necessidade.
Essas formalizações oferecem segurança a todos, garantindo que a ocupação seja autorizada e reconhecida. Assim, evita-se a ideia de que um irmão está usando o imóvel sozinho, impedindo que o prazo para usucapião se inicie.
Extinção de condomínio: alternativa para quem não ocupa
Quando falta um acordo escrito e o ambiente se torna propício à usucapião, o coproprietário que não está usando o imóvel pode optar por uma ação de extinção de condomínio. Essa ação busca encerrar a copropriedade por meio da venda judicial do imóvel, com o dinheiro da venda sendo repartido entre os coproprietários.
Um caso recente mencionado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) envolveu a venda de uma casa onde apenas dois dos três irmãos a utilizavam, resultando em uma indenização mensal para o irmão que ficou de fora. Nesse tipo de litígio, a pessoa que não ocupa o imóvel quer uma compensação pelo uso exclusivo dos outros e, se não há consenso, a venda do bem.
O entendimento é que ninguém deve ficar preso indefinidamente a um bem comum.
Indenização por uso exclusivo e preferência na compra
João Victor explica que essa disputa geralmente se desdobra em dois pedidos. O primeiro é a indenização pelo tempo em que o imóvel só foi utilizado por parte dos irmãos, funcionando como um “aluguel” proporcional. O segundo busca a venda judicial do imóvel para resolver a situação de copropriedade.
Os que estão ocupando têm direito de preferência na compra. Se não a utilizam, o juiz pode determinar um leilão, definindo os prazos e regras. Depois da venda, cada um recebe sua parte, considerando as despesas e compensações.
É importante lembrar que ainda podem ser feitos acordos, desde que formalizados por escrito.
Sinais de alerta e providências imediatas
Herdeiros devem estar atentos a sinais de exclusividade na posse, como mudança de fechaduras sem aviso, pagamentos de tributos apenas por um dos irmãos e a realização de obras sem comunicação aos demais. Esses elementos podem indicar que apenas um coproprietário está exercendo domínio sobre o imóvel.
Diante dessa situação, é bom formalizar um termo de uso ou notificar o ocupante para deixar claras as condições e responsabilidades, desmontando a ideia de posse exclusiva. Além disso, registrar acordos durante o inventário ou, se já tiver terminado, firmar documentos privados com assinaturas reconhecidas pode ajudar. Fazendo isso, as regras ficam claras e diminui a chance de discussões futuras sobre posse.
O que fica de lição para famílias em inventário
Os casos de usucapião entre herdeiros não acontecem só por má-fé. Muitas vezes, um dos filhos assume a responsabilidade de cuidar do imóvel e, sem a documentação necessária, acaba criando a situação que leva à posse. A lei oferece alternativas para regularizar o uso do imóvel ou até mesmo para encerrar a copropriedade sem prejudicar quem não ocupa.
O caminho a seguir depende do diálogo e, quando a comunicação falha, de atitudes rápidas para proteger os direitos de cada um.



