Estudo revela perfil de mulheres que representam 86% da profissão

Cuidadores de Pessoas com Alzheimer: Um Desafio Majoritariamente Feminino
Um recente estudo publicado na Revista Brasileira de Psiquiatria destaca que 86% dos cuidadores de pessoas diagnosticadas com Alzheimer e outras doenças neurodegenerativas são mulheres. Essas cuidadoras desempenham um papel essencial no atendimento diário que esses pacientes precisam. O estudo também revelou os altos custos financeiros associados ao tratamento da demência no Brasil.
Os pesquisadores observaram que os custos aumentam à medida que a doença avança. Em estágios iniciais, as famílias gastam cerca de R$ 5.513, enquanto que no estágio intermediário o valor sobe para R$ 7.266,27. No estágio avançado, esse custo pode chegar a R$ 8.690,73. Além disso, 73% dos gastos são arcados pelos familiares mais próximos, como filhos e netos.
O estudo identificou que uma parcela significativa dos custos está relacionada aos custos indiretos, que incluem a perda de produtividade do cuidador, o tempo dedicado aos cuidados e o impacto na qualidade de vida de todos os envolvidos. A pesquisa detectou que os custos indiretos correspondem a 78,5% dos gastos totais no estágio inicial, 81,8% no estágio moderado e 72,9% no estágio avançado.
Quanto ao perfil das cuidadoras, a média de idade é de 57,8 anos e 29,3% delas têm entre 9 e 11 anos de escolaridade. O estudo foi realizado em 17 municípios brasileiros em 2023, como parte do Relatório Nacional sobre a Demência no Brasil, com o apoio do Ministério da Saúde.
Mulheres à Frente do Cuidado
Na família de Tamires Alves, o cuidado com a saúde tem sido um legado feminino que se estende por gerações. Sua avó cuidou de sua bisavó, diagnosticada com Alzheimer, e hoje a responsabilidade pela avó de Tamires é dividida entre várias mulheres da família, incluindo sua mãe e tias, enquanto seu tio ajuda com as despesas.
Tamires relata que a dinâmica familiar envolveu inicialmente uma de suas tias se afastando do trabalho para cuidar da avó. Com o tempo, a organização da família se tornou mais complexa, sendo necessário contratar um cuidador para os dias de semana e criar um rodízio entre as mulheres nos finais de semana. Tamires, que é biomédica e pesquisadora, destaca a importância de evitar a sobrecarga em um papel que já desafia a saúde emocional e física dos cuidadores.
Ela explica que mesmo com a ajuda, cuidar de um paciente com Alzheimer é extremamente desgastante. "Cuidar por um dia é como lutar em várias batalhas", diz Tamires.
Vida Pessoal em Segundo Plano
A presidente da Associação Brasileira de Alzheimer (Abraz), Celene Queiroz, observa que a maioria das cuidadoras no Brasil são mulheres que enfrentam essa responsabilidade praticamente sozinhas, uma situação que reflete questões sociais mais amplas. Ela afirma que o cuidado é visto como uma característica essencialmente feminina, o que leva muitas a abrir mão de suas vidas pessoais em prol da família.
A pesquisadora Cleusa Pinheiro Ferri, que coordenou o relatório, aponta que essa sobrecarga de trabalho é um reflexo das expectativas sociais de que as mulheres cuidem de todos os membros da família, gerando impactos significativos na saúde mental delas.
O cuidado de alguém com Alzheimer pode durar até 15 anos, aumentando o risco de que as cuidadoras desenvolvam quadros de ansiedade e depressão. Muitas delas acabam se perdendo em suas identidades, deixando de ser, por exemplo, apenas “Joana,” e tornando-se “a filha do seu Alberto” em tempo integral.
Roxana Reys, uma cuidadora de 57 anos, exemplifica essa situação ao falar sobre a decisão de acolher sua mãe de 89 anos, diagnosticada com Alzheimer. A mudança trouxe tensões em seu relacionamento conjugal, resultando em uma separação. Agora, Roxana divide seu dia entre o trabalho e os cuidados com a mãe, sempre ciente de que a doença pode piorar a qualquer momento.
"Aproveito cada momento com ela, mas também sei que preciso cuidar da minha saúde e minha qualidade de vida", afirma Roxana.
O estudo também observa que, sem um suporte mais estruturado, a responsabilidade pelos cuidados continuará recaindo principalmente sobre as mulheres. Embora existam iniciativas públicas para melhorar a situação, ainda é um desafio constante para as famílias.
A expectativa é que até 2050 o número de pessoas com demência no Brasil triplique. Portanto, melhorar o suporte e os recursos para cuidadores não é apenas uma questão de saúde pública, mas uma necessidade urgente para aliviar a carga financeira e emocional que essas mulheres enfrentam diariamente.