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Brasil pode adotar novo idioma e surpreender o mundo

A recente publicação do livro Assim Nasceu uma Língua, escrito pelo linguista português Fernando Venâncio, tem dado uma nova cara à discussão sobre o futuro da língua portuguesa no Brasil. Lançado pela editora Tinta da China, o trabalho de Venâncio instiga um debate interessante sobre a origem dessa língua e o possível surgimento de um novo idioma no Brasil, batizado de “brasileiro”.

Venâncio faz uma proposta ousada: a língua que falamos hoje em Portugal não se originou precisamente no que hoje conhecemos como esse país. Ele aponta para o Brasil, nossa antiga colônia, como o verdadeiro protagonista de uma evolução que pode fazer com que o idioma aqui falado seja reconhecido como “brasileiro” no futuro.

De acordo com o autor, a história da língua portuguesa começa no século 5 d.C., no antigo Reino da Galiza, que surgiu após a queda do Império Romano. É curioso notar que, atualmente, apenas uma parte desse território integra Portugal; a maior parte pertence à Galícia, uma comunidade autônoma na Espanha com cidades como Santiago de Compostela e Vigo.

Para Venâncio, é difícil aceitar a ideia de que, em algum momento, um idioma estrangeiro pudesse ser a língua de Portugal. Ele destaca que Lisboa, a capital portuguesa, ficou sob domínio árabe por mais de 700 anos. Nesse período, o moçárabe, uma variante de dialetos com forte influência árabe, era o mais falado por lá.

Isso ajuda a explicar por que temos palavras como “almofada”, “açougue” e “fulano” no nosso vocabulário atual. Enquanto isso, a língua galega começou a se desenvolver, estabelecendo as bases para o que viria a ser o português.

Hoje, há movimentos culturais na Galícia para preservar o galego, que vem perdendo espaço para o castelhano, o idioma oficial da Espanha. Venâncio menciona que, embora algumas pessoas tentem reverter essa tendência, é desafiador, pois o castelhano carrega um certo prestígio.

O galego ainda é visto como um idioma associado ao campo e, como resultado, perde força nas grandes cidades. Neste contexto, Portugal, que nasceu como reino em 1139, procurou se distanciar da Galícia, especialmente após a região ter sido incorporada a Castela.

O termo “galego-português” é usado para caracterizar a fase inicial do português, referindo-se a um período em que as semelhanças com o galego eram mais evidentes. Para Venâncio, a língua portuguesa começou como uma variação do galego, sendo moldada no sul, mas mantendo mais similaridade com o galego do que com o castelhano.

Outro ponto interessante é a palavra “saudade”, que se encontra tanto no português quanto no galego, desafiando a ideia de que é uma exclusividade nossa.

Origem e evolução da língua portuguesa

O livro de Venâncio também destaca as influências galegas no que podemos chamar de idioma brasileiro. Por exemplo, o diminutivo “-inho”, presente em palavras como “cafezinho” e “Ronaldinho”, tem raízes na língua galega, que já existia antes da chegada dos portugueses ao Brasil.

Além disso, expressões típicas do Nordeste, como “oxente”, também têm essa influência, mesmo sem confirmação definitiva de sua origem. Enquanto alguns afirmam que a expressão pode ter vindo do inglês "oh shit" durante a Segunda Guerra, Venâncio acredita que suas raízes estão no noroeste da Península Ibérica.

No galego, “xente” significa “gente”, e o som do “x” frequentemente substitui os sons de “g” e “j”. Outro uso interessante do termo “galego” no Nordeste é para referir-se a pessoas loiras, o que remete a migrações da Galícia no passado.

Diferenças entre português e idioma brasileiro

Venâncio não é um defensor do purismo linguístico. Ele observa que crianças portuguesas têm incorporado términos brasileiros, como a troca de “frigorífico” por “geladeira”. Segundo ele, isso não quer dizer que o português de Portugal está se perdendo, mas reflete a influência cultural do Brasil.

No entanto, o linguista acredita que há um processo de afastamento entre o português e o que chamamos de idioma brasileiro. Ele afirma que essa distinção é inevitável e já pode ser considerada uma norma própria, destacando o jeito mais espontâneo com que o português é falado aqui.

Unidades e divergências linguísticas

Mesmo com essas diferenças, linguistas e gramáticos de ambos os lados do Atlântico reconhecem que as normas gramaticais e morfológicas das duas variantes têm uma boa dose de unidade. Elementos como artigos, pronomes e preposições permanecem iguais em muitos contextos, especialmente na variante culta.

Essa união gramatical torna difícil afirmar que existe, de fato, uma língua brasileira separada. Porém, Venâncio argumenta que a forma espontânea e informal de falar no Brasil acelera a diferenciação em relação ao português europeu. Ele compara isso ao processo que levou o latim a se dividir em vários idiomas, sugerindo que o português pode seguir um caminho similar.

Para Venâncio, é empolgante pensar que, assim como aconteceu com os romanos, estamos vivendo uma transformação na nossa língua que, quem sabe, um dia resultará em novos idiomas.

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