COP30 e a destruição de floresta para uma nova avenida na Amazônia

Belém, no Pará, é o cenário de uma situação incrível e, ao mesmo tempo, preocupante. A cidade foi escolhida para sediar a COP30, a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas. Esse evento vai reunir líderes e especialistas de mais de 190 países entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025. A escolha de Belém, anunciada pela ONU em dezembro de 2023, veio após uma disputa intensa entre várias cidades brasileiras.
Com anos de preparação pela frente, Belém se transformou em um verdadeiro canteiro de obras nos últimos meses. A expectativa era alta, já que o evento estava prestes a chamar a atenção do mundo para a Amazônia, a maior floresta tropical do planeta. Mas o que deveria ser uma celebração da sustentabilidade começou de forma bem contraditória.
A construção de uma nova avenida de 13 quilômetros, chamada Avenida Liberdade, idealizada para receber os mais de 50 mil visitantes esperados, resultou na derrubada de várias árvores em áreas que até então estavam preservadas. Essa nova estrada corta regiões próximas à Área de Proteção Ambiental de Belém (APAB), e imagens de satélite mostram claramente o desmatamento que está acontecendo. Estima-se que mais de 100 hectares de floresta amazônica foram perdidos na construção dessa infraestrutura.
Esse impacto visual é alarmante: uma grande cicatriz na natureza por conta de um evento que se propõe a lutar pela saúde do planeta.
Comunidades afetadas e o silêncio das autoridades
Mas as consequências vão além da vegetação. Comunidades locais de produtores de açaí, pescadores e ribeirinhos estão vendo seu modo de vida afetado. Cláudio Verequete, um morador da região, relatou que a chegada das máquinas para a construção significou a destruição de roçados que garantiam sua renda. Segundo ele, até agora, não houve qualquer tipo de indenização oferecida.
Por outro lado, o governo do Pará tenta se distanciar dessa obra. Em uma nota oficial, alegou que a construção da Avenida Liberdade não estava diretamente relacionada à COP30, afirmando que o projeto já existia desde 2012. No entanto, ambientalistas discordam dessa justificativa. Para eles, a forma rápida com que a obra foi executada mostra que há uma preocupação em modernizar Belém antes do grande evento.
A questão das compensações ambientais também levanta dúvidas. O governo prometeu plantar três árvores para cada uma que foi derrubada, mas não há informações claras sobre quando e como isso vai ocorrer. Enquanto a fauna e flora locais sofrem, a falta de clareza sobre as promessas de replantio deixa muitos preocupados.
A contradição da cúpula do clima
A escolha de Belém como sede da COP30 visava transmitir uma mensagem importante: a Amazônia não é um problema, mas uma solução para as questões climáticas. Contudo, com a destruição inicial, o evento se tornou um símbolo de contradição ecológica.
Especialistas levantam um ponto crucial: como podemos falar sobre o fim do desmatamento enquanto abrimos avenidas na floresta? Essa nova estrada pode causar o chamado efeito borda, que fragmenta o ecossistema e abre espaço para exploração ilegal. Isso eleva os riscos de invasões e queimadas, causando danos que vão além da obra em si.
A perspectiva internacional do Brasil também está em risco. Em um momento que o país busca se consolidar como um líder em questões ambientais, ver hectares de floresta sendo derrubados para um evento climático gera perplexidade e críticas na mídia internacional.
A Avenida Liberdade, que poderia ser um símbolo de progresso sustentável, agora se tornou um exemplo de uma profunda contradição: destruir árvores para salvar o clima? Essa obra representa a perda de 107 campos de futebol de floresta e ameaça a vida de mais de 250 famílias.
Entre o progresso e o paradoxo
O caso de Belém ilustra um dilema enfrentado por muitos países que recebem grandes conferências ambientais. Existe a necessidade de infraestrutura para garantir a segurança e o conforto das delegações, mas a um alto custo para o meio ambiente.
No caso da COP30, esse contraste é ainda mais intenso, porque o evento acontece em uma região tão sensível quanto a Amazônia. A avenida é vista como uma modernização urbana por alguns, mas para as comunidades que dependem da floresta, representa apenas perda e abandono.
Enquanto os líderes discursam sobre metas climáticas, as pessoas que vivem à sombra dessa árvore gigante ainda esperam por soluções. Ironia das ironias: a floresta, que deveria ser o palco de uma celebração, acabou sendo o preço a se pagar para preparar o cenário da COP30.



