Nova raça de cachorro do Brasil ganha destaque internacional

O amor pelos cães no Brasil vai muito além dos nossos adorados vira-latas. Embora os "caramelos" tenham conquistado o coração de muitos após o sucesso de um filme na Netflix, as raças de cães também têm seu espaço na nossa cultura. Uma novidade que está em alta é o reconhecimento do buldogue campeiro, que pode, em breve, ser oficialmente reconhecido internacionalmente.
Em 2024, o buldogue campeiro deu um passo importante ao receber o reconhecimento provisório da FCI (Federação Cinológica Internacional). Essa entidade é responsável por regular e divulgar os padrões de raças caninas ao redor do mundo. Se tudo correr como esperado, ele irá se juntar a outras raças brasileiras que já têm sua oficialização, como o fila brasileiro e o terrier brasileiro, também conhecido como fox paulistinha.
Raiz gaúcha e espírito trabalhador
O nome já traz um pouco da sua história. Os buldogues campeiros descendem de buldogues ingleses que foram trazidos por imigrantes na região sul do Brasil. Fazendeiros locais realizaram cruzamentos para adaptar esses cães às suas necessidades, buscando um animal forte, ágil e capaz de lidar com o gado em terrenos desafiadores.
Esses cães também foram essenciais em abatedouros, ajudando a contabilizar o gado. A descrição oficial da CBKC (Confederação Brasileira de Cinofilia) destaca suas principais características: um cão robusto, com a cabeça larga, uma mandíbula firme e um focinho forte o suficiente para segurar um boi. Nos anos 1960, a raça se espalhou pelo Centro-Oeste, acompanhando os gaúchos que migraram para Mato Grosso do Sul. Porém, com o surgimento de novas raças e mudanças nas normas sanitárias, o uso do buldogue campeiro diminuiu.
Resgate e reconhecimento
Graças ao trabalho de criadores no Rio Grande do Sul, a raça foi resgatada e padronizada. A CBKC começou a promover e proteger a raça, permitindo o registro oficial dos cães e iniciando o processo para o reconhecimento internacional. Em 2023, já contávamos com cerca de 13 mil cães da raça registrados, predominantemente no sul do Brasil, além de Uruguai e Argentina. Alguns deles começaram a ser exportados para outros continentes.
Ricardo Torre-Simões, diretor técnico da CBKC, destaca a rusticidade como a principal característica do buldogue campeiro. “É um cão que suporta o trabalho no campo e pode ficar longos períodos sem supervisão direta”, explica. Em termos de temperamento, ele é leal, protetor e carinhoso. “Mesmo sem boiada, ele se adapta bem à vida familiar, convive tranquilamente com crianças e cuida da casa.”
Força, proporção e elegância
O padrão físico do buldogue campeiro é bem específico. Eles são de porte médio, com pelo curto, corpo compacto e musculoso. As fêmeas costumam ser um pouco maiores que os machos. A cabeça deve ser ampla e robusta, mas sem rugas em excesso. O focinho ideal deve medir de um terço a um quarto do comprimento da cabeça, com olhos ovais e pelagem variada. Esses detalhes são cruciais para manter a uniformidade entre os cães e preservar as características que tornam a raça única.
Como nasce uma raça oficial
A FCI reúne confederações de 101 países, conhecidas como “kennel clubs”. Cada um pode propor o reconhecimento de suas espécies nativas. Quando essa proposta é aprovada, a raça recebe um status provisório, como é o caso do buldogue campeiro. Durante um período de dez anos, a federação monitora cruzamentos, genealogias e análises de DNA para garantir a estabilidade genética. Se tudo se mantiver saudável, o reconhecimento torna-se definitivo. Caso contrário, o processo pode ser prolongado até que a consistência desejada seja alcançada.
Padrões que influenciam o mercado pet
As normas que definem as raças não impactam apenas criadores e expositores. Elas também moldam a percepção popular sobre o que é um “cão bonito” ou “bem proporcionado”. Expressões como “porte nobre” e “focinho achatado e fofo” surgem a partir desses critérios. Assim como na moda, em que as tendências dos desfiles influenciam as vitrines, os padrões das raças também guiam comportamentos e consumos no mundo pet.
A bióloga Donna Haraway aponta que a criação de raças reflete os gostos e valores dos humanos. Segundo ela, a criação seletiva de cães segue uma lógica semelhante à da moda, passando por ciclos de popularidade e transformação.
Tradição e adaptação da raça
O buldogue campeiro é um exemplo perfeito do equilíbrio entre tradição e adaptação. Embora tenha sido criado para o pastoreio, também se tornou um cão de companhia em grandes cidades. “Mesmo longe do campo, ele aprende rápido o que fazer, porque tem o instinto de trabalhar em grupo”, comenta Torre-Simões.
O reconhecimento internacional é muito mais que um selo técnico. Ele representa o resgate de uma histórias que entrelaçam cultura rural, herança europeia e a capacidade única dos brasileiros de transformar desafios em identidade. O buldogue campeiro, portanto, segue firme em seu caminho para se consolidar como uma raça oficial mundial, levando consigo um pedacinho do nosso campo e do espírito trabalhador que o formou.



