Herdeiros da BMW acumulam US$ 47 bilhões e evitam exposição público

Com uma fortuna que ultrapassa os US$ 47 bilhões, os irmãos Stephan Quandt e Susanne Klatten estão entre os mais ricos tanto da Alemanha quanto do mundo. Eles são os principais acionistas da BMW, uma das marcas de carros mais icônicas e valiosas. Mas, ao contrário de muitos bilionários que adoram aparecer nas redes sociais e em festas luxuosas, esses herdeiros optam pelo anonimato. Essa escolha não é apenas uma questão de estilo de vida; ela está profundamente ligada a um passado familiar complicado e controverso.
O silêncio da família Quandt, como muitos apontam, não é apenas uma preferência pessoal. Ele é alimentado por um legado sombrio que envolve a colaboração com o regime nazista de Adolf Hitler. A maneira como a fortuna deles foi construída remete a períodos críticos da história, gerando discussões sobre responsabilidade e memória histórica.
A origem do império e a conexão nazista
A trajetória da família Quandt no mundo dos negócios começou modestamente lá no século XIX. Em 1883, Emil Quandt abriu uma fábrica de tecidos que, após conseguir um contrato para fornecer uniformes ao exército imperial alemão, decolou rapidamente. O verdadeiro impulso veio com seu filho, Günther Quandt, que transformou o pequeno negócio em uma potência industrial. Durante a Primeira Guerra Mundial, ele se tornou o principal fornecedor de tecidos e couro para forças armadas, acumulando um capital que depois foi vital para expandir o império familiar, com investimentos estratégicos em setores como energia e, claro, na BMW.
Quando o Partido Nazista chegou ao poder em 1933, a ascensão dos Quandt ganhou um novo contorno. Tanto Günther quanto seu filho Herbert se alistaram no partido e estreitaram laços com as lideranças do regime. A ex-esposa de Günther, Magda, se casou com Joseph Goebbels, o porta-voz de Hitler, o que solidificou ainda mais sua conexão com o círculo poderoso da época. Isso rendeu a Günther uma posição de destaque como “Líder da Economia Militar”, colocando suas empresas no centro do esforço de guerra.
Lucros de guerra e o uso de trabalho forçado
Durante a Segunda Guerra Mundial, o conglomerado dos Quandt se tornou essencial para a maquinária bélica nazista. Suas fábricas produziam não só uniformes, mas também armas, munições e as baterias que alimentavam os submarinos U-boat e os mísseis V-2. Porém, os lucros não vinham unicamente de contratos governamentais. Investigadores, incluindo repórteres do The New York Times, descobriram que a família se aproveitou da arianização — a compra de empresas de judeus por preços baixos durante o regime.
Outro ponto triste dessa história envolve o uso de trabalho forçado. As fábricas dos Quandt exploraram mais de 57.000 pessoas, entre prisioneiros de guerra e civis, que eram submetidos a condições desumanas para atender às demandas de produção. Há relatos de que Herbert Quandt teve papel na criação de um campo de concentração próximo a uma de suas fábricas na Polônia, o que intensifica a discussão sobre como uma parte significativa da fortuna familiar foi erguida sobre essas práticas.
O pós-guerra e a aposta que salvou a BMW
Após a derrota da Alemanha, seria de se esperar que pessoas como Günther, associados ao regime, enfrentassem consequências severas. Ele foi preso em 1946, mas, em 1948, foi absolvido e classificado como um “Mitläufer”, um termo que minimizava sua colaboração ativa. Especialistas sugerem que os Aliados estavam mais preocupados em reerguer a economia da Alemanha Ocidental do que em punir os industriais envolvidos com os nazistas.
Com o falecimento de Günther em 1954, seus filhos Herbert e Harald dividiram o império. Foi nesse período que Herbert tomou uma decisão arriscada que mudaria a história da BMW. No fim da década de 1950, a empresa estava quase falida, e a compra pela concorrente Daimler-Benz parecia iminente. Ignorando os conselhos ao seu redor, Herbert decidiu investir sua fortuna pessoal para manter o controle da empresa. E foi sua aposta no lançamento do BMW 1500, em 1962, que reverteu a situação, levando a marca ao status global de luxo.
O silêncio das novas gerações e a revelação pública
Após a morte de Herbert em 1982, o comando da BMW passou para sua terceira esposa, Johanna, e seus filhos, Susanne e Stephan. Eles herdarão não só a fortuna, mas também uma cultura de silêncio. Por muitos anos, viveram como praticamente desconhecidos, embora fossem os acionistas de uma das marcas mais reconhecidas da Alemanha. Essa relação com o silêncio foi desafiada em 2007, quando o documentário "O Silêncio dos Quandt" revelou a colaboração da família com o regime nazista.
Inicialmente, a reação da família foi de negação. No entanto, a pressão pública os levou a contratar um historiador para investigar o passado. O estudo confirmou as informações do documentário, mas um pedido formal de desculpas nunca foi feito. O que houve foram reconhecimentos parciais e relutantes, enquanto a família continue a honrar seus antepassados. O nome de Günther Quandt permanece em sua fundação, e um prêmio de jornalismo leva o nome de Herbert.
A fortuna continua a prosperar, mas a sombra do passado ainda é um peso que não pode ser ignorado.