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Mar de plástico na Espanha: estufas que viraram horta da Europa

O “Mar de Plástico”, localizado no sul da Espanha, é um fenômeno que atraí a atenção do mundo todo. Situado entre as cidades de El Ejido e Almeria, esse vasto complexo de estufas cobre uma área de 32 mil hectares, o que equivale a aproximadamente 44 mil campos de futebol. De acordo com a Nasa, é a única construção humana que pode ser vista a olho nu do espaço.

Sob as coberturas brancas de plástico, cerca de quatro milhões de toneladas de alimentos são produzidas anualmente. Isso inclui delícias como tomates, pimentões, pepinos, melancias e melões. Impressionante é que mais da metade dessa produção vai para exportação, consolidando a região como uma verdadeira horta da Europa.

Agricultura em uma das regiões mais áridas da Europa

O que torna o “Mar de Plástico” ainda mais notável é a geografia da sua localização. A província de Almeria é uma das áreas mais secas do continente europeu. Com uma média de apenas 54 dias de chuva por ano, a transformação desse deserto em uma potência agrícola foi um grande desafio.

Nos anos 50, em meio às dificuldades, o governo espanhol resolveu investir em soluções criativas. A estratégia incluiu o uso de aquíferos subterrâneos e a adaptação de estufas holandesas, substituindo o vidro por plástico para resistir aos ventos intensos da região. Assim, o que antes era um deserto árido transformou-se em um polo agrícola responsável por cerca de 18% das exportações agrícolas da Espanha.

Motor econômico e geração de empregos

Atualmente, o “Mar de Plástico” é fundamental para a economia de Almeria. A atividade agrícola movimenta cerca de US$ 5,1 bilhões por ano, representando 40% do PIB da região. Isso gera aproximadamente 100 mil empregos diretos e indiretos, tornando-se tão crucial quanto o turismo local.

Os produtos cultivados ali abastecem grandes mercados, incluindo Alemanha, Reino Unido, França, Itália e até Estados Unidos.

Tradição agrícola e exportadora

O sucesso do “Mar de Plástico” não é recente. Desde o século 19, Almeria exportava produtos como uvas para o Reino Unido, reconhecidas pela sua qualidade. Com o passar do tempo, a região se beneficiou de investimentos em tecnologias de irrigação e cultivo, pavimentando o caminho para uma produção intensa que vemos hoje. São cerca de 12 mil propriedades agrícolas, muitas de pequeno e médio porte, mas todas conectadas a um sistema de exportação globalizado.

Tecnologias de irrigação e cultivo

Um dos segredos da alta produtividade do “Mar de Plástico” é a irrigação por gotejamento. Essa técnica permite economizar água de maneira significativa. Estudos indicam que a região utiliza cerca de 60% menos água do que outras áreas agrícolas ao redor do mundo. Além disso, a adição de areia para ajudar na retenção de água no solo superou os desafios da aridez, tornando o deserto muito fértil.

Críticas ambientais: água e plástico em excesso

Apesar da transformação impressionante, há preocupações sobre o futuro do “Mar de Plástico”. Especialistas apontam para a superexploração dos aquíferos que já mostram sinais de esgotamento. As estufas consomem cerca de 1,3 bilhão de litros de água por ano, e o aquífero de Níjar é explorado além da sua capacidade de regeneração há mais de duas décadas.

Outro aspecto crítico é o lixo plástico. A produção das estufas gera cerca de 30 mil toneladas de plástico por ano, com apenas 85% sendo reciclados. Isso contribui para o acúmulo de microplásticos em ecossistemas marinhos próximos, como o Mar de Alboran e o Cabo de Gata.

Questões sociais e condições de trabalho

Além dos desafios ambientais, existem questões sociais e trabalhistas a serem discutidas. Cerca de 60% da mão de obra é formada por migrantes, especialmente do norte da África. Relatórios de direitos humanos indicam que muitos enfrentam exploração, condições de moradia precárias e salários baixos.

Estima-se que cerca de 25 mil trabalhadores atuem sem contrato formal. Mesmo entre aqueles que têm emprego, muitos vivem em habitações improvisadas, sem acesso adequado a água e eletricidade. Em cidades como El Ejido, a alta porcentagem de estrangeiros gerou tensões sociais, apesar de ter um dos menores índices de desemprego da Andaluzia, a região é uma das mais desiguais em termos de distribuição de renda.

O desafio da sustentabilidade

Diante desses desafios, muitos especialistas defendem que o modelo de produção do “Mar de Plástico” precisa de melhorias para se tornar sustentável. As sugestões incluem:

  • Uso mais racional da água
  • Redução da produção intensiva
  • Melhoria das condições de trabalho
  • Gestão eficiente dos resíduos plásticos

Os produtores estão em busca de soluções, ampliando o uso de fontes alternativas de água, como usinas de dessalinização e o reaproveitamento da água da chuva. Nos últimos anos, as condições trabalhistas também têm melhorado, com mais contratos regulares para estrangeiros.

Entre o milagre e a contradição

O “Mar de Plástico” é um exemplo de como é possível cultivar alimentos em uma das regiões mais áridas da Europa. No entanto, essa conquista expõe contradições: uma riqueza econômica que não se reflete plenamente no bem-estar da população, riscos ambientais relacionados ao uso da água e o acúmulo de resíduos plásticos, além das tensões sociais geradas pela grande presença de trabalhadores migrantes.

O futuro dessa região depende do equilíbrio entre produtividade, sustentabilidade e justiça social.

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