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Acidente com césio-137: drama real por trás da série da Netflix

Em setembro de 1987, um lindo pó azul que encantava tanto crianças quanto adultos no centro de Goiânia foi o início de uma tragédia que mudaria a história do Brasil: o maior acidente radiológico do país envolvendo o Césio-137. O que muitos viam como um tesouro brilhante era, na verdade, um material superradioativo que havia se soltado de um aparelho de radioterapia abandonado em uma clínica desativada.

A contaminação se espalhou rapidamente, impulsionada pela curiosidade e pela falta de conhecimento sobre os perigos que aquele pó representava. O incidente, que ficou classificado como nível 5 na Escala Internacional de Acidentes Nucleares (INES), causou mortes, deixou centenas de pessoas contaminadas e gerou um estigma que ainda afeta a cidade e seus habitantes quase quatro décadas depois. A história desse acidente serve como um alerta sobre a importância da fiscalização e os riscos da negligência.

Cronologia de um desastre anunciado

O acidente começou com um descarte irresponsável e se desenrolou ao longo de 15 dias de pânico até ser identificado.

13 de setembro de 1987: Dois catadores de sucata, Roberto dos Santos Alves e Wagner Mota Pereira, encontram um aparelho de radioterapia em ruínas no Instituto Goiano de Radioterapia (IGR). Pensando ser uma boa oportunidade, eles vendem a peça para Devair Alves Ferreira, que é dono de um ferro-velho.

18 de setembro de 1987: Devair, admirado pelo brilho azul que a cápsula emite no escuro, decide abri-la. Ele descobre 19,26 gramas de cloreto de césio-137 e, de maneira irresponsável, começa a distribuir o pó para amigos e familiares.

21 de setembro de 1987: O irmão de Devair, Ivo Ferreira, leva uma porção do pó para casa. Sua filha, Leide das Neves Ferreira, de apenas 6 anos, brinca com o material, espalhando-o por todo o corpo. Tragicamente, ela se tornaria um símbolo da calamidade.

28 de setembro de 1987: Depois de dias com sintomas como vômitos e queimaduras, a esposa de Devair, Gabriela Maria Ferreira, leva um pedaço da cápsula para a Vigilância Sanitária. Um físico, Walter Mendes Ferreira, é chamado e rapidamente identifica o perigo.

29 de setembro de 1987: A Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) é acionada, e uma grande operação de emergência é iniciada.

A resposta e as consequências devastadoras

A identificação do Césio-137 levou a uma operação de grande escala. Mais de 112 mil pessoas foram monitoradas no Estádio Serra Dourada em busca de contaminação. No total, 249 pessoas tiveram níveis significativos de radiação, e 129 delas precisaram de atendimento médico.

As consequências foram horríveis:

Quatro mortes iniciais: Leide das Neves, Gabriela Maria Ferreira, e dois funcionários do ferro-velho, Israel Baptista dos Santos e Admilson Alves de Souza, faleceram nas semanas seguintes em decorrência da Síndrome Aguda da Radiação.

Lixo radioativo: A operação de limpeza resultou na remoção de 6.000 toneladas de material contaminado. Isso incluiu demolições de casas, roupas e móveis. Todo esse material foi acondicionado em contêineres de concreto e levado para um depósito especializado em Abadia de Goiás, onde ficará por séculos.

Impactos a longo prazo: Os sobreviventes ainda enfrentam um risco aumentado de desenvolver câncer, além de problemas emocionais como depressão e estresse pós-traumático.

O legado: estigma e lições aprendidas

O acidente com o Césio-137 deixou marcas profundas na cidade de Goiânia. Seus habitantes enfrentaram um grande estigma, sendo apelidados de “Goiannobyl”, que resultou em boicotes a produtos locais e discriminação.

Esse trágico evento, no entanto, serviu como um chamado para a ação em todo o mundo. A experiência levou a um endurecimento das leis e fiscalização sobre materiais radioativos no Brasil, além de influenciar protocolos de segurança globalmente. Hoje, esse caso é revisitado em diversos documentários e livros, e mais recentemente, em uma série da Netflix, garantindo que a memória desse desastre nunca se apague.

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