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A capital planejada do Brasil nos anos 80 e seu impacto climático

Construída rapidinho nos anos 80, Palmas é uma cidade que nasceu do sonho de transformar o Tocantins em um polo de desenvolvimento. Com suas avenidas largas e um planejamento urbano que buscou aprender com os acertos e erros de Brasília, Palmas é um grande experimento do urbanismo brasileiro.

Porém, por trás desse planejamento, surgiu uma surpresa: um fenômeno climático que ninguém esperava. Enquanto muitos acreditam que o grande lago que cercou a cidade é o responsável pelo aumento das temperaturas, estudos mais profundos apontam que a verdadeira causa é o imenso concreto e asfalto que dominam a cidade.

Uma capital por decreto: a escolha geopolítica por trás de Palmas

A criação de Palmas foi uma decisão política muito bem pensada. Com a Constituição de 1988, que surgiu com a formação do estado de Tocantins a partir da divisão do norte de Goiás, a construção de uma nova capital se tornou uma necessidade urgente. O primeiro governador, Siqueira Campos, decidiu não adaptar uma cidade já existente, mas sim construir uma do zero, mostrando a ambição de um novo estado. A localização escolhida, na margem direita do rio Tocantins, visava impulsionar uma área que historicamente foi deixada de lado.

O DNA de Palmas: modernismo tardio e a correção de Brasília

O projeto de Palmas é uma mistura de referências, principalmente de Brasília. Os criadores da cidade, Luís Fernando Cruvinel Teixeira e Walfredo Antunes de Oliveira Filho, se inspiraram no que já havia sido feito, mas buscaram corrigir alguns pontos que não agradavam. Em vez das superquadras de Brasília, com prédios isolados em grandes áreas verdes, as quadras de Palmas foram concebidas como “cidadelas” autossuficientes, onde comércio e serviços de uso diário estariam integrados. A ideia era criar uma sensação de comunidade e facilitar a vida dos moradores, algo que Brasília não conseguia.

Avenidas de 8 pistas: uma cidade projetada para o carro

Apesar das boas intenções, a estrutura urbana de Palmas privilegia muito os carros. Com um traçado urbano bem organizado, onde as avenidas como a Teotônio Segurado e a Juscelino Kubitschek contam com até oito pistas, o foco foi na fluidez do trânsito. Essa forma de planejar a cidade garantiu que o fluxo de veículos fosse eficiente, mas também fez com que os pedestres e ciclistas ficassem em segundo plano.

Esse modelo trouxe um impacto no dia a dia dos moradores, enfatizando o uso do carro e moldando o estilo de vida da população, que acabou afetando, de forma inesperada, o clima local.

O lago que mudou a paisagem, mas não o clima

Um dos grandes marcos de Palmas é o lago artificial criado pela Usina Hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães. Com 626 km², ele trouxe um novo visual para a cidade e se tornou uma área de lazer. Muitas pessoas pensam que esse lago mudou o clima local, mas estudos indicam que é o urbanismo que realmente faz a diferença. A pesquisa do arquiteto Luis Hildebrando Ferreira Paz mostrou que a verdadeira razão para o aumento da temperatura é a morfologia urbana, com mais asfalto e pouca vegetação.

Ilha de calor: o verdadeiro fenômeno climático de Palmas

O estudo de Luis Hildebrando está na linha de frente ao identificar as Ilhas de Calor Urbanas (ICU) em Palmas. Ele constatou que as áreas construídas estão diretamente ligadas ao aumento da temperatura, enquanto os parques e áreas verdes funcionam como verdadeiros refúgios de frescor, com temperaturas muito mais amenas. A pesquisa mostrou diferenças de até 8 °C entre áreas verdes e pavimentadas.

A conclusão foi clara: o grande responsável pelo calor não é o lago, mas sim a cidade em si, com suas superfícies que absorvem o calor. A vegetação nativa é menos impactante nessa mudança microclimática do que o concreto e o asfalto que dominam a paisagem urbana.

No final das contas, Palmas, a última capital planejada do Brasil, é um exemplo das consequências não intencionais que podem surgir do planejamento urbano. Embora tenha alcançado altos índices de qualidade de vida, seu foco no transporte individual criou desafios ambientais, mostrando que o sucesso de um projeto pode trazer efeitos colaterais inesperados.

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