Cidade de SP sem semáforos é 4º lugar em qualidade de vida

A pouco mais de duas horas da capital paulista, encontramos a charmosa Águas de São Pedro. Este pequeno município se destaca por uma curiosidade incomum: não possui cemitério nem delegado fixo. Com mais de 80 anos de história, essa estância turística figura na 4ª posição do ranking nacional de qualidade de vida, segundo o Índice de Progresso Social (IPS).
Aqui, a rotina é tranquila. As ruas arborizadas e a ausência de semáforos criam um ambiente pacato, onde as tradições ainda são valorizadas — um aspecto raro em grandes cidades. Para muitos moradores, essa serenidade é um dos principais motivos para permanecer na cidade.
Choque de realidades
Marcelo Brega, que mora em Águas de São Pedro há 20 anos, lembra bem da mudança de ritmo que experimentou ao deixar a agitação da capital. “Foi um baita choque. Como bom paulistano, cresci no meio do trânsito. Aqui, não temos nem semáforo. Não tem violência. Já deixei a porta da minha casa aberta e não aconteceu nada”, diz.
Esse senso de segurança é notável. A delegacia local, por exemplo, conta com pouca demanda. Orlando Cirino, um aposentado de 85 anos que também vive na cidade há quase duas décadas, comenta: “Tem uma delegacia, mas não tem delegado. Temos um escrivão e, às vezes, um investigador. É um local com pouco trabalho”.
Cidade segura e relações de confiança
Quando algo precisa ser registrado, os moradores vão até a delegacia da cidade vizinha, São Pedro, que fica a apenas 7 km. Mas isso não acontece com frequência. A fama de calma e a confiança mútua entre vizinhos e comerciantes tornam a cidade um lugar acolhedor.
“Tem histórias que mostram como as pessoas se conhecem aqui. O padeiro deixa o pão no portão e eu pago depois. Pode ser amanhã ou até na próxima semana. Ninguém desconfia, porque todos se conhecem”, conta Cirino. Essa confiança e a baixa criminalidade ajudam a manter a essência de uma cidade do interior, mesmo com a proximidade de grandes centros urbanos.
A busca pelo “ouro negro”
A atual tranquilidade contrasta com o passado de Aguias de São Pedro. Nos anos 1920, acreditava-se que a região escondia jazidas de petróleo. O governo estadual promoveu perfurações, mas encontrou apenas água. Essa história alimentou rumores de que o escritor Monteiro Lobato teria perdido dinheiro na região.
Apesar do insucesso, a antiga torre de perfuração se tornou um marco histórico. E o que parecia um fracasso acabou mudando a trajetória do lugar.
Da frustração ao encanto das águas
Na década de 1930, o comerciante Octavio Moura Andrade visitou a região e se deparou com aquelas águas escuras e de odor forte. Embora inicialmente rejeitada como petróleo, a água revelou-se benéfica para o gado. Andrade ficou tão impressionado que comprou uma fazenda e construiu o que, mais tarde, se tornaria o Grande Hotel São Pedro. Isso deu início ao desenvolvimento da estância hidromineral e à formação do município.
Décadas depois, estudos do Instituto de Pesquisas Tecnológicas da USP confirmaram as propriedades medicinais dessas águas.
A cidade onde ninguém é enterrado
Por conta das águas medicinais, a cidade nunca teve um cemitério. Quando alguém falece, o corpo é levado para cidades vizinhas, como São Pedro ou Piracicaba. Marcelo Brega lembra de uma tentativa de abrir um velório local, mas o espaço acabou desativado e virou um prédio público. A única exceção é Octavio Moura Andrade, que está sepultado na Capela Nossa Senhora Aparecida, localizada no ponto mais alto de Águas de São Pedro.
Apesar do tamanho, a cidade é vibrante, com um calendário ativo de eventos culturais e esportivos. Um exemplo é o grupo Chorões da Velha Guarda, formado por moradores que preservam a tradição do samba e do choro. Orlando Cirino faz parte do grupo e se orgulha de sua história. “Tocamos samba e choro há quase 20 anos. O grupo inclui pessoas que vieram de fora. Um integrante era meu conhecido em Santos, que não via há 30 anos. Nos reencontramos aqui”.
Um estilo de vida que conquista
Para quem vive em Águas de São Pedro, a verdadeira riqueza é o estilo de vida. Marcelo Brega resume bem o sentimento: “Depois que a gente se acostuma, é difícil querer sair. Em São Paulo, me perco de nervoso no trânsito”.
Não é surpresa que a cidade tenha uma boa colocação no ranking de qualidade de vida. A combinação de segurança, confiança comunitária e águas medicinais transformaram esse pequeno município em um lugar especial. Para muitos, Águas de São Pedro não é apenas um endereço, mas sim um canto encantador no interior paulista.