Fronteira entre França e Brasil: uma porta da União Europeia na Amazônia

A maior fronteira “da França” não é com a Alemanha, a Espanha ou a Bélgica. Ela se estende pela Amazônia, ligando o Brasil à Guiana Francesa, que é um território ultramarino da União Europeia. Isso significa que, na prática, temos uma porta da Europa bem na nossa floresta tropical, e as regras e custos desse acesso afetam a vida de muitos brasileiros.
O pesquisador Matheus Boa Sorte, que estuda a região, aponta que essa fronteira traz um misto de desigualdade e integração. Por exemplo, os brasileiros precisam pagar 60 euros para obter visto, além de taxas veiculares, enquanto os franceses conseguem entrar no Brasil com muito menos burocracia.
Onde fica a maior fronteira “da França”
No Brasil, essa ligação acontece em Oiapoque, um município do Amapá. Atravessando o rio Oiapoque, encontramos a cidade de Saint-Georges, na Guiana Francesa. Lá, as placas em francês se misturam com o português, e o comércio local depende quase exclusivamente da presença de turistas e consumidores da União Europeia.
A estrada BR-156, que liga Macapá a Oiapoque, é um verdadeiro desafio, como descreve Boa Sorte: “um asfalto que aparece e desaparece.” Essa estrada tem 578 km, mas 158 km ainda não são pavimentados, o que acaba dificultando a integração entre os países.
Quanto custa cruzar essa fronteira
A ponte que conecta os dois países sobre o rio Oiapoque, embora tenha custado cerca de R$ 130 milhões, só começou a operar em 2017, após muitos atrasos. O uso da ponte é desigual, pois os franceses atravessam livremente, enquanto os brasileiros enfrentam a burocracia dos vistos de 60 euros e seguros para veículos, que começam a partir de 95 euros.
Muitos não conseguem arcar com esses custos e optam por alternativas mais em conta, como os catraeiros, que fazem a travessia de canoa entre Oiapoque e Saint-Georges. Essa travessia custa em torno de 4 euros, cerca de R$ 30 para ida e volta. É uma tradição que se mantém forte, mesmo com a existência da ponte.
Quem vive e trabalha na faixa de fronteira
De acordo com o Itamaraty, cerca de 91,5 mil brasileiros residem na Guiana Francesa, correspondendo a cerca de 30% da população do território. Muitos trabalham na construção civil, no comércio e em serviços, atraídos por salários que podem passar de 1.700 euros mensais.
Do outro lado, os franceses atravessam a fronteira buscando preços mais acessíveis em alimentos e lazer em Oiapoque. Esse contraste econômico garante uma circulação constante entre os dois lados, reforçando uma interdependência real.
Por que essa fronteira é estratégica
A Guiana Francesa não é apenas um pedaço isolado de terra. Ela abriga a base espacial de Kourou, crucial para os lançamentos da União Europeia. Também possui recursos naturais significativos, como ouro e bauxita, além de vastas áreas florestais.
A linha que define essa fronteira foi estabelecida em 1900, após um conflito territorial conhecido como Conflito do Amapá. Uma decisão tomada na Suíça garantiu ao Brasil o domínio do rio Oiapoque, solidificando a fronteira que conhecemos hoje.
Vale a pena conhecer Oiapoque e a região?
Matheus Boa Sorte acredita que a região é cheia de experiências únicas. O ecoturismo é uma grande atração, com o Parque Nacional do Cabo Orange, o Parque Montanhas do Tumucumaque e a encantadora cachoeira Grã-Rochê (Maripá).
Além das belezas naturais, a produção de chocolates artesanais que valorizam sabores amazônicos, como o cumaru, também merece destaque. Apesar das dificuldades logísticas, Oiapoque reflete a rica mistura cultural entre Brasil e França. É um lugar onde euros e reais coexistem, junto com tradições locais e costumes europeus.
A maior fronteira “da França” é uma das mais intrigantes do mundo, unindo a União Europeia ao Brasil no coração da Amazônia. Essa conexão traz desafios, como altos custos e desigualdades, mas também oportunidades de intercâmbio cultural e econômico, mostrando que a integração pode ser um caminho de mão dupla.