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Usina termosolar mais cara do mundo é um fracasso ambiental

Um dos projetos mais ambiciosos da era Obama, pensado para mostrar que a energia solar de concentração poderia iluminar lares mesmo à noite, agora está em processo de desmantelamento. A Ivanpah Solar Power Facility, situada no deserto de Mojave, na Califórnia, teve seu início apoiado por investimentos federais, colaborações do Google e promessas de inovação. No entanto, falhas técnicas, impacto ambiental e um avanço tecnológico mais rápido do que o esperado acabaram com suas aspirações.

Quando os pássaros se tornaram vítimas da energia “limpa”

Desde que começou a operar em 2014, Ivanpah chamava atenção pela sua escala impressionante: três torres de 140 metros cercadas por mais de 173 mil heliostatos, que são espelhos que refletem a luz solar para aquecer caldeiras e gerar vapor. A ideia era substituir combustíveis fósseis por energia limpa com a ajuda de armazenamento térmico. Mas o projeto teve um efeito colateral devastador: se tornou uma armadilha mortal para aves.

Estimativas de biólogos e organizações ambientais indicam que até 28 mil aves perdiam a vida anualmente, ressequidas pelo calor extremo de mais de 500°C, que causava combustão instantânea em suas penas. Além disso, a ameaça a espécies em perigo, como a tartaruga do deserto, provocou protestos e levou a debates sobre o impacto ambiental real do projeto.

US$ 2,18 bilhões e um desempenho abaixo do esperado

Com um custo total de US$ 2,18 bilhões, sendo US$ 1,6 bilhão oriundos de empréstimos do Departamento de Energia dos EUA, a usina era uma aposta na tecnologia de torres solares como alternativa à energia fotovoltaica. No entanto, a realidade não foi gentil com Ivanpah.

A manutenção dos milhares de heliostatos era cara e as torres frequentemente enfrentavam falhas de alinhamento. Para piorar, o sistema apresentava perdas térmicas que tornavam a operação menos eficiente. O que era para ser uma usina de “zero emissão” acabou usando gás natural para atingir as temperaturas mínimas das turbinas, frustrando os defensores da energia totalmente limpa.

O golpe final: energia cara em uma era de painéis baratos

No decorrer do tempo, a energia solar fotovoltaica, que utiliza os painéis tradicionais, passou a ser cada vez mais acessível. Dados recentes mostraram que o custo médio do megawatt-hora dessa tecnologia caiu mais de 80% na última década. Enquanto isso, Ivanpah, usando uma tecnologia desatualizada, ainda operava com contratos de energia a preços fixos firmados em 2014.

Essa diferença de custo fez com que a Pacific Gas & Electric (PG&E) decidisse encerrar os contratos com a usina em 2025. A empresa argumentou que não fazia mais sentido financeiro manter acordos tão dispendiosos quando havia opções mais vantajosas no mercado.

Um “boondoggle” de US$ 2 bilhões

Críticos da usina a rotularam de “boondoggle”, um termo que descreve projetos onerosos e infrutíferos financiados com dinheiro público. Além do impacto ambiental, Ivanpah não atingiu o retorno energético prometido e, frequentemente, operou abaixo de 60% de sua capacidade. O uso de gás natural só prejudicou mais sua proposta inicial.

O engenheiro David G. Victor, da Universidade da Califórnia, disse que Ivanpah é uma lição sobre os riscos de apostar alto em tecnologias que ainda não estão prontas.

O que virá depois de Ivanpah?

Com a rescisão dos contratos e o desligamento das unidades, a equipe da usina já se mobiliza para um plano de transição. A área de 13 km², que já possui infraestrutura elétrica conectada à rede, deverá ser transformada em campos de painéis fotovoltaicos com baterias de lítio para armazenamento. Essa mudança se alinha à tendência global de promover uma descarbonização mais eficiente e de baixo custo.

Esse modelo novo acompanha o caminho traçado por países como China e Índia, que têm investido em usinas solares híbridas que apresentam flexibilidade e custos menores de operação. A Ivanpah, que começou como um símbolo de inovação, agora é um lembrete sobre promessas tecnológicas que podem ter chegado um pouco cedo demais.

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