Morre Jean-Claude Bernardet, crítico de cinema, aos 88 anos

Jean-Claude Bernardet, um dos mais influentes críticos de cinema do Brasil, faleceu na manhã deste sábado, aos 88 anos. Ele estava internado no Hospital Samaritano, em São Paulo, enfrentando problemas de saúde relacionados ao HIV e um câncer reincidente na próstata, optando por não fazer tratamento com quimioterapia. Além disso, Bernardet lidava com a quase perda da visão devido a uma degeneração ocular.
A confirmação de sua morte foi feita pelo cineasta Fábio Rogério, que estava ao seu lado. Ainda não foram divulgados detalhes sobre as causas do falecimento. O velório acontecerá na Cinemateca Brasileira, com informações sobre o horário a serem comunicadas em breve.
Nascido na Bélgica, em 2 de agosto de 1936, Bernardet passou a infância em Paris antes de se mudar para o Brasil aos 13 anos. Ele se naturalizou brasileiro em 1964 e se formou em artes gráficas no Senac. Sua carreira foi marcada por uma ampla atuação como crítico, professor, historiador, roteirista e cineasta.
Bernardet lecionou na Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP) e foi um ativo militante de esquerda. Durante a ditadura militar, ele foi cassado e sua aposentadoria forçada, mas foi reintegrado em 1979, após a Lei de Anistia. Seu trabalho crítico era notável pela diversidade de filmes que abordava e por suas análises profundas sobre movimentos cinematográficos no Brasil, como o Cinema Novo e o Cinema Marginal.
Ele se destacou por sistematizar informações sobre a produção cinematográfica nacional, o que está evidenciado em seu livro “Historiografia Clássica do Cinema Brasileiro”, publicado em 1995. Bernardet também era conhecido por seu estilo provocador e por não hesitar em criticar seus colegas cineastas, mantendo um diálogo aberto com eles, como Eduardo Coutinho, que valorizava suas opiniões em seus documentários.
Um aspecto interessante da trajetória de Bernardet é sua vivência intensa do presente. Em 2018, ele declarou que tinha poucas lembranças do passado e estava focado em projetos teatrais, como a direção da peça “A Procura de Emprego”.
Ao longo de sua carreira, Bernardet produziu contribuições significativas para a crítica de cinema no Brasil. Mesmo após ter seu mestrado interrompido pela ocupação militar na Universidade de Brasília, publicou “Brasil em Tempo de Cinema” em 1967, onde analisou filmes brasileiros e discutiu suas ligações com a realidade social do país. Essa obra provocou debates acirrados, incluindo críticas de cineastas como Glauber Rocha.
Ele também explorou a relação entre cinema e sociedade em outros trabalhos, como “Cineastas e Imagens do Povo”, que analisou a representação da temática popular em documentários brasileiros dos anos 60 e 70. Em sua análise, destacava a tensão entre o cinema e a realidade brasileira, frequentemente criticando a maneira como a produção cinematográfica lidava com questões sociais e políticas.
Além de suas atividades como crítico, Bernardet atuou em filmes e peças ao longo de sua vida, conquistando prêmios e reconhecimento. Em 2008, ele recebeu o prêmio de melhor ator no Festival de Brasília pelo seu desempenho em “FilmeFobia”.
Durante seus últimos anos, Bernardet enfrentou problemas de saúde, incluindo a escolha de não tratar um câncer de próstata, e escreveu sobre a mercantilização da medicina em seu livro “O Corpo Crítico”. Ele falava sobre a opressão sofrida por grupos sociais, refletindo críticas à sociedade contemporânea.
Bernardet deixa uma filha, Lígia, fruto de seu casamento com Lucila Ribeiro. Sua vida e obra permanecem um legado importante para a cultura e a crítica cinematográfica brasileira.