Máquina da ASML de US$ 400 milhões controla produção de chips avançados

Em um laboratório superlimpo na Holanda, uma máquina do tamanho de um ônibus de dois andares e que custa US$ 400 milhões poderia ser considerada a mais importante do planeta. Esse equipamento, que pertence à ASML, é o grande responsável por impulsionar a produção de chips. Com ele, grandes empresas como Intel, Samsung e TSMC estão em uma disputa acirrada, pois sem essas máquinas, o avanço da inteligência artificial e de toda a economia digital poderia parar.
A chave para todo esse movimento está em uma tecnologia que parece saída de um filme de ficção científica: a litografia por luz ultravioleta extrema (EUV). O segredo está em usar luz com um comprimento de onda de apenas 13,5 nanômetros, o que é tão pequeno que só consegue passar em um ambiente sem ar. Para isso, toda a produção acontece em um vácuo perfeito.
A Luz que Corta o Invisível
A criação dessa luz é um espetáculo tecnológico. Dentro de uma câmara de vácuo, 50 mil gotículas de estanho líquido são disparadas por segundo. Cada gota recebe o impacto de um laser superpotente, criando uma bola de plasma ainda mais quente que a superfície do Sol. Essa explosão emite os fótons de luz EUV, que não conseguem passar por lentes comuns.
Em vez de lentes, são utilizados espelhos superprecisos fabricados pela Zeiss, chamados de superfícies mais planas já feitas pela humanidade. Se a superfície da Terra fosse tão lisa quanto um desses espelhos, a montanha mais alta teria apenas alguns milímetros de altura. Todo esse processo é utilizado para "imprimir" circuitos em pastilhas de silício, resultando em bilhões de transistores menores do que um fio de cabelo.
O que Torna a Nova Máquina High-NA Tão Especial?
A nova máquina da ASML, chamada High-NA, representa um marco na tecnologia EUV. O termo "alta abertura numérica" se refere à capacidade de captar mais luz e em ângulos mais amplos. Isso significa que ela pode gravar padrões ainda menores e mais complexos em uma única exposição.
Esse avanço é como uma revolução industrial para a fabricação de chips. Antes, eram necessárias várias exposições da pastilha de silício para criar uma só camada de chip. Com a High-NA, esse trabalho é feito em menos etapas, o que resulta em uma produção mais rápida e com menos defeitos.
Por outro lado, o transporte dessas máquinas é uma operação gigantesca. Cada unidade é composta por mais de 100 mil peças e 2 km de cabos, e para sua movimentação são necessários sete aviões cargueiros Boeing 747 e várias carretas.
O Monopólio da ASML: de uma Cabana ao Controle Global
A trajetória da ASML começou de maneira bem humilde, em 1984, em um galpão em Eindhoven, como uma subsidiária da Philips. Enquanto muitos investiam em tecnologias mais tradicionais, um grupo de engenheiros decidiu acreditar na litografia EUV, mesmo enfrentando diversas falhas ao longo dos anos. Agora, a ASML é a única empresa no mundo capaz de produzir essas máquinas. Sem ela, gigantes da tecnologia como Apple e Nvidia enfrentariam sérias dificuldades para fabricar seus chips.
Por que a China Ficou de Fora?
Enquanto Intel, TSMC e Samsung brigam pelas poucas máquinas High-NA disponíveis, a China está fora desse jogo. Uma política dos Estados Unidos proíbe a venda dessas máquinas para empresas chinesas. O objetivo é evitar que a China consiga desenvolver chips mais avançados para inteligência artificial e até uso militar.
Como resposta, a China começou a estocar máquinas de gerações anteriores e investir bilhões para tentar desenvolver sua própria tecnologia. Contudo, recriar todo o ecossistema da ASML, que envolve centenas de fornecedores especializados, é visto como um desafio quase impossível.
O Dilema Energético e o Futuro dos Chips
Apesar dos avanços, um problema sério pode ameaçar todo esse progresso: o consumo de energia. As máquinas EUV High-NA consomem muita eletricidade, e a própria ASML admite que esse é um desafio.
Se os chips não se tornarem mais eficientes energeticamente, atividades como o treinamento de modelos de inteligência artificial e o funcionamento de data centers poderão se tornar inviáveis. Com a necessidade crescente por chips, a corrida tecnológica agora é também uma corrida por eficiência energética.
Essa história sobre como uma única máquina de US$ 400 milhões vem dominando o mundo dos chips ilustra não apenas a força da tecnologia, mas também as batalhas geopolíticas e os desafios de sustentabilidade que moldarão nosso futuro digital.