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Netos podem ser obrigados a pagar pensão a avós idosos

Quando o assunto é pensão alimentícia no Brasil, muitas pessoas logo pensam em pais que sustentam filhos ou, em alguns casos, filhos que ajudam seus pais idosos. Mas a legislação brasileira vai além disso. O Código Civil traz em seus artigos 1.694 e 1.696 a ideia de que essa responsabilidade é mútua e intergeracional, atingindo toda a família. Ou seja, em situações difíceis, avós podem ter que sustentar os netos e vice-versa. E sim, netos também podem ser chamados a ajudar financeiramente os avós se os filhos não puderem.

Essa regra se baseia no princípio da solidariedade familiar, que enxerga a família como um sistema de apoio onde cada geração cuida da outra em momentos complicados.

O que a lei prevê sobre alimentos entre parentes

O artigo 1.694 do Código Civil determina que “os parentes podem pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com sua condição social”. Já o artigo 1.696 reafirma que essa obrigação é recíproca, ou seja, pais e filhos têm responsabilidades face a face, se estendendo aos ascendentes, como os avós.

Na prática, isso significa que:

  • Filhos são as primeiras pessoas que devem contribuir para o sustento dos pais;
  • Se não houver filhos disponíveis, ou se eles não puderem ajudar financeiramente, a Justiça pode considerar que os netos devem assumir essa responsabilidade.

Esse sistema é uma maneira de garantir que os idosos não fiquem sem apoio financeiro, evitando situações de abandono ou pobreza.

Base legal para obrigar os netos a ajudar

Para entender como funciona essa obrigação, veja os pontos-chave:

  • O artigo 1.694 afirma que parentes podem requisitar alimentos de acordo com a necessidade e capacidade financeira de ambos.
  • O artigo 1.696 amplia essa visão, incluindo não apenas pais e filhos, mas todos os ascendentes, o que significa que netos podem ser acionados a ajudar se os filhos não puderem sustentar os avós.

Jurisprudência que confirma essa obrigação

Embora a situação em que netos são chamados a pagar pensão para os avós não seja tão comum, essa "obrigação alimentar avoenga invertida" já foi reconhecida várias vezes pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Vamos a alguns exemplos:

  • Em 2019, uma avó idosa procurou o STJ por assistência financeira dos netos após perder todos os filhos. O tribunal garantiu sua obrigação, destacando que a solidariedade familiar é recíproca.
  • Em 2021, o TJ-SP decidiu que três netos deveriam pagar pensão à avó, considerando a comprovada incapacidade econômica dos filhos e estabelecendo valores proporcionais de acordo com a condição financeira de cada neto.
  • Em 2022, o TJ-MG também reafirmou que, mesmo com filhos, se eles estiverem incapazes de ajudar, os netos podem ser chamados a arcar com essa responsabilidade.

Essas decisões evidenciam que a Justiça vê essa obrigação como essencial para a solidariedade familiar.

Critérios aplicados pela Justiça na determinação das pensões

Quando se trata de definir a quantia a ser paga, a Justiça analisa dois fatores principais: necessidade e possibilidade.

  • Necessidade: É preciso comprovar que o avô ou a avó realmente se encontram em uma situação de vulnerabilidade, como problemas de saúde, idade avançada ou sem renda.
  • Possibilidade: Aqui, os netos devem contribuir de acordo com suas condições financeiras. Por exemplo, um neto com um salário maior pode ter que ajudar mais do que um que está apenas começando a carreira.

Esse equilíbrio busca proteger tanto o idoso quanto o neto, garantindo que a responsabilidade não sobrecarregue apenas uma pessoa.

Impacto social do envelhecimento da população brasileira

Esse tema é especialmente relevante com o envelhecimento acelerado da população brasileira. De acordo com dados do IBGE, é esperado que, até 2030, o número de idosos no Brasil supere o de crianças até 14 anos.

Com isso, a pressão sobre os sistemas de proteção social, como a Previdência, aumenta e, infelizmente, conflitos familiares sobre sustento também devem ser mais comuns. Em casos onde os filhos não conseguem ajudar, seja por desemprego ou problemas de saúde, é natural que a responsabilidade recaia sobre os netos.

A diferença entre obrigação moral e obrigação legal

A responsabilidade de cuidar dos avós é frequentemente vista como um dever moral. Mas quando a questão entra na esfera legal, esse dever se torna uma obrigação jurídica.

Tanto o Código Civil quanto a jurisprudência tornam formal esse cuidado intergeracional. Muitos, porém, podem não ter ciência desse direito, o que resultaria em avós vulneráveis sem o suporte que a lei garantiza.

Especialistas comentam sobre a ampliação do dever

A advogada de família Regina Beatriz Tavares da Silva comenta que o dever de prestar alimentos não se limita apenas a filhos e pais, mas se estende para garantir que nenhum idoso fique desamparado.

O professor Rolf Madaleno, referência em Direito de Família, acrescenta que essa dinâmica não é uma forma de punir os netos, mas sim uma maneira de distribuir responsabilidades. Para ele, o Direito Brasileiro trata a família como uma rede de apoio que deve ir além do primeiro grau de parentesco.

Críticas e desafios práticos

Apesar do respaldo legal nessa questão, sua aplicação enfrenta alguns desafios:

  • Distribuição proporcional: Definir quanto cada neto deve pagar pode acabar gerando disputas judiciais e conflitos familiares.
  • Capacidade financeira: Muitos netos, especialmente os mais jovens, podem não ter renda suficiente para contribuir, e a Justiça precisa levar isso em conta.
  • Efeitos emocionais: A imposição judicial de pensão pode gerar tensões nas relações familiares além do aspecto financeiro.

Ainda assim, especialistas concordam que o princípio da dignidade da pessoa humana deve prevalecer, assegurando que os idosos não sejam deixados desassistidos.

Solidariedade familiar reconhecida em lei

A lei é clara: os netos podem, sim, ser obrigados a contribuir para o sustento de seus avós em situações de necessidade. Essa medida reforça a ideia de que a família deve ser a primeira rede de proteção social antes de qualquer outra.

Em um país que envelhece rapidamente, essa solidariedade familiar é fundamental para garantir que todos tenham dignidade na velhice. E quando os filhos não podem ajudar, é justo que os netos assumam sua parte nessa responsabilidade.

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