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Brasília registra 212 dias de calor extremo e seus efeitos

O sol de Belém, que já simbolizou a vida vibrante da Amazônia, agora traz um calor insuportável para os moradores, especialmente naqueles bairros onde as árvores já não existem mais. Com temperaturas que atingem até 37,3 °C, a capital paraense se destaca como uma das cidades brasileiras com os maiores índices de calor extremo. Em 2024, a cidade enfrentou nada menos que 212 dias de calor recorde, um choque para quem precisa se locomover sem sombra nas ruas.

Dentre os afetados, está João Victor da Silva, ou simplesmente “João do Clima”, um jovem de 16 anos que se tornou uma voz ativa na luta contra a crise climática. Sua trajetória se intensificou após a perda da mãe, Lene, por câncer de pele, uma tragédia que João atribui às desigualdades sociais e ao impacto das mudanças climáticas. Ele conseguiu transformar a dor em ativismo, participando de discussões importantes, como a COP30, que aconteceu em Belém.

O retrato da desigualdade climática

A diferença entre os bairros nobres e as periferias de Belém é gritante. De acordo com o Censo de 2022, a cidade é a sexta no Brasil com mais pessoas vivendo em áreas sem árvores. Enquanto os bairros centrais contam com mangueiras que tornam o ambiente mais agradável, as comunidades mais humildes veem o asfalto refletir o calor, tornando a vida insuportável.

No bairro do Jurunas, Ronald Monteiro, de 15 anos, sente essa realidade na pele. Ele ajuda o pai a vender açaí, e o calor que começa por volta das 11h30 é tão intenso que o jovem compara a sensação a "uma máquina de bater açaí". “É insuportável, não tem como dormir. O calor me deixa esgotado”, desabafa.

E a situação não é só um relato pessoal. Dados da UFPA e do Inmet mostram que Belém registrou 164 dias com temperaturas acima dos 35,5 °C nesta década, um número que supera os últimos 60 anos. O meteorologista Everaldo de Souza explica que a destruição da cobertura vegetal aumentou drasticamente o calor, resultado da perda de cerca de 20% da floresta desde 1985.

A juventude que perdeu o direito à sombra

João do Clima já percebeu como o tipo de rua representa um alívio ou um sofrimento. “As ruas de terra são mais frescas porque a terra resfria o ambiente”, comenta. Indignado com a sujeira e a degradação do seu bairro, ele organizou mutirões para limpar a área e até plantou árvores. O resultado foi uma praça verde, que hoje serve como um refúgio para jovens que buscam um alivio do calor intenso.

Com sua luta, João se tornou um representante da juventude da Amazônia. “Estamos na mesma tempestade, mas em barcos diferentes. Alguns têm condições, outros não”, afirma, referindo-se à desigualdade entre estudantes que aprendem em salas climatizadas e aqueles que sufocam em locais sem circulação de ar.

Quando o calor atinge até o sabor do açaí

O calor extremo em Belém também impacta a economia local, especialmente em torno do amado açaí. Ronald, que vai para o campo colher as frutas com o pai, percebe que as palmeiras estão mais fracas, resultando em cachos menores e menos qualidade. “O açaí agora vem mais ressecado e com caroço duro”, lamenta.

A chamada “crise do açaí” em 2025 encareceu significativamente o produto, com o litro da polpa subindo de R$ 18,40 para R$ 28 em um único ano, forçando as famílias a diluírem o açaí com água para economizar. Pesquisadores apontam que as mudanças climáticas, a alteração nos padrões de chuva e a exportação da fruta estão reduzindo a oferta local.

Apesar das chuvas mais frequentes, elas ocorrem em períodos concentrados, prejudicando a floração do açaizeiro. “Está chovendo mais, mas na hora errada. Isso atrapalha o ciclo do fruto”, resume Everaldo.

Dormir virou luxo nas noites paraenses

A vida nas periferias de Belém se torna ainda mais complicada quando a noite chega. Sem árvores para amenizar o calor e com o asfalto irradiando o calor acumulado, Ronald reclama que não consegue dormir à tarde. “Até tomo banho para tentar relaxar, mas não adianta. O corpo cansa demais”, explica.

Essa privação de sono afeta o desempenho diário, e o médico Everaldo aponta que essas condições de calor extremo têm efeitos sobre a saúde que ainda não foram completamente estudados. Ele alerta que o sono é essencial para o corpo se resfriar e, sem um descanso adequado, o estresse se acumula, impactando a saúde e aprendizado.

O futuro incerto da cidade mais quente da Amazônia

Atualmente, Belém representa um colapso climático. Com 20% de sua floresta urbana extinta, chuvas irregulares e 212 dias de calor por ano, os jovens como João e Ronald enfrentam um pesado desafio: fazer suas vozes serem ouvidas e lutar por um futuro melhor.

João expressa sua frustração ao dizer que gostaria de ser apenas um adolescente, mas não pode se afastar das questões ambientais: “Se a gente não agir, o futuro simplesmente não vai existir.” Especialistas alertam que, se Belém não se voltar para um reflorestamento urbano e outras iniciativas, o cenário só tende a piorar.

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