Experimento da Magirus-Deutz com motor a ar em ônibus no Brasil

No final da década de 1960, o transporte coletivo no Brasil viu uma tentativa ousada de inovação com a chegada da Magirus-Deutz, uma famosa fabricante alemã. Em 1967, a empresa começou a operar em Simões Filho, na Bahia, com uma proposta que prometia revolucionar os ônibus urbanos: chassis com motores diesel refrigerados a ar. A ideia era impressionante para a época, mas o que parecia uma solução original rapidamente se tornou uma história pouco lembrada no Brasil.
A fabricação dos primeiros ônibus urbanos e rodoviários foi realizada na plantação baiana da Magirus-Deutz. Esses veículos eram equipados com o motor F6L, que tinha seis cilindros e 8,7 litros de deslocamento, proporcionando até 135 cavalos de potência. O grande diferencial desse motor era sua refrigeração a ar, em vez de água, tecnologia rara para veículos de grande porte daquele período. Além disso, o câmbio manual de seis marchas, sem sincronizadores, exigia habilidade dos motoristas, semelhante ao que se via em caminhões.
Magirus-Deutz e os Desafios do Clima
Nos primeiros meses, os chassis da Magirus-Deutz cativaram operadores de transporte, que valorizavam a robustez e a facilidade de manutenção. A configuração monobloco, que integrava carroceria e chassi, facilitava a personalização e beneficiava o transporte coletivo em diversas regiões do Brasil. Contudo, essa aceitação inicial logo se viu comprometida por problemas técnicos, agravados pelo clima tropical.
O calor intenso das cidades brasileiras expôs uma limitação significativa: os motores a ar, que eram eficientes em climas mais frios, enfrentavam sérios problemas de superaquecimento. Ex-motoristas relataram que os veículos costumavam apresentar problemas de temperatura elevada, tornando difícil a operação em linhas urbanas com alta demanda. A lenta resposta da fabricante para resolver essas questões, juntamente com a falta de peças, afetou a percepção do público sobre os chassis.
A Tentativa de Reviravolta com o Motor V8
Para tentar reverter a situação, a Magirus-Deutz lançou, em 1970, uma versão mais potente: o chassi RSL413, com o motor F8L413, um V8 diesel refrigerado a ar, capaz de entregar 230 cavalos de potência. Isso colocou o modelo entre os poucos ônibus brasileiros equipados com motores V8. No entanto, os problemas de superaquecimento persistiram, especialmente em trajetos longos nas grandes cidades.
Com a perda da operabilidade e as dificuldades para fornecer peças de reposição, a situação tornou-se insustentável. Em 1972, a Magirus-Deutz decidiu encerrar suas operações no Brasil. As empresas de transporte começaram a substituir os motores a ar por alternativas tradicionais, refrigeradas a água, que estavam mais adaptadas às condições locais. Isso fez com que os ônibus Magirus-Deutz, em sua maioria, perdessem a configuração mecânica original e se tornassem raridades.
Raridade e Legado
O experimento da Magirus-Deutz é um exemplo de como a adaptação de tecnologias internacionais às nossas condições pode ser desafiadora. Com a saída da empresa, a escassez de peças e a falta de assistência técnica prejudicaram ainda mais a situação operacional dos veículos. Como resultado, os chassis Magirus-Deutz rapidamente se tornaram raridades em museus e coleções no Brasil.
Atualmente, encontrar um ônibus Magirus-Deutz em funcionamento é uma verdadeira raridade. O sistema de motor traseiro e o câmbio manual, embora inovadores, não resistiram aos rigores do transporte público nos anos 70. Essa história nos lembra da importância de considerar todas as variáveis locais na introdução de novas tecnologias.
Em suma, a experiência com ônibus a ar da Magirus-Deutz trouxe lições valiosas sobre a adaptação da engenharia ao nosso país. A preferência por motores a diesel refrigerados a água se consolidou justamente após episódios como esse, levando as montadoras a buscar soluções mais alinhadas às necessidades e realidades do transporte coletivo brasileiro.