As eleições de 2024 estão cada vez mais próximas, e um tema que ganha destaque é a influência das redes sociais no cenário político. Um caso recente em Itararé (SP) ilustra bem como figurinhas no WhatsApp e fake news estão complicando o direito de resposta, um dos instrumentos fundamentais para garantir a justiça eleitoral.
Em julho, circulou na cidade uma figurinha no WhatsApp com a imagem de Fernando Henrique da Silva, candidato à prefeitura pelo PL-SP, acompanhada da frase “odeio viado”.
O incidente rapidamente ganhou repercussão, principalmente nas redes sociais como Instagram e Facebook, onde o político possui cerca de 50 mil seguidores. Silva acusou seu adversário, João Jorge Fadel Filho, do PP-SP, de estar por trás da criação e disseminação da imagem.
A intensa “guerra” no WhatsApp
A situação se intensificou quando Silva fez um vídeo nas redes sociais, alegando que o coordenador de campanha de Fadel, identificado como Alemão, estava espalhando as figurinhas. Silva chegou a afirmar que registraria um boletim de ocorrência para responsabilizar o adversário legalmente.
Surpreendentemente, quem entrou com pedido de direito de resposta foi Fadel, alegando que Silva o caluniou ao associá-lo à criação da figurinha.
No entanto, sua petição inicial foi negada em primeira instância. O juiz Jocimar Dal Chiavon alegou que o pedido estava inapropriado, já que não havia o texto de resposta proposto anexado. A situação foi levada ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, onde a ação foi julgada improcedente em 26 de agosto, embora a juíza Maria Cláudia Bedotti tenha discordado da avaliação inicial.
Ela ressaltou que, no caso de conteúdos digitais, não há exigência legal de que o texto da resposta seja anexado ao pedido, algo obrigatório apenas em veículos impressos.
Direito de resposta e a situação catastrófica nas eleições
Essa situação levanta questões sobre a eficácia do direito de resposta em tempos de comunicação digital. Afinal, como garantir que uma réplica tenha o mesmo alcance de uma ofensa nas redes sociais, onde a disseminação de conteúdo é amplamente impulsionada por algoritmos?
Como no caso das figurinhas, determinar o público exato que recebeu a ofensa e garantir que a resposta chegue até eles é um desafio que a legislação eleitoral brasileira ainda não resolveu completamente.
A Lei Eleitoral, atualizada em 2009 e 2017 para incluir previsões sobre direito de resposta na internet, enfrenta dificuldades para lidar com a velocidade e a amplitude das redes sociais.
Pedidos aumentaram?
Até o início de setembro, 52 pedidos de direito de resposta haviam sido registrados na Justiça Eleitoral, sendo 33 deles referentes a conteúdo publicado em redes sociais.
A lei de 1997 que regula o direito de resposta estabelece que candidatos, partidos ou coligações podem solicitar uma resposta se forem vítimas de calúnia, difamação, injúria ou notícias sabidamente falsas. Contudo, aplicar essa legislação no ambiente digital é uma tarefa cada vez mais complexa.
Uma das dificuldades é garantir que a resposta tenha o mesmo impacto da ofensa. A legislação exige que a resposta seja publicada no mesmo local e com as mesmas características da ofensa original, como tempo de exposição, tamanho e alcance.
Porém, quando se trata de redes sociais, o público atingido nem sempre é claro. A falta de transparência no funcionamento dos algoritmos das plataformas agrava esse problema, pois não se sabe exatamente como o conteúdo foi distribuído.
Outro aspecto desafiador é o fato de que as redes sociais muitas vezes resistem a fornecer informações sobre o alcance dos conteúdos, alegando que esses dados estão protegidos por segredo industrial. Esse conflito dificulta ainda mais a aplicação eficaz do direito de resposta.
Prejuízo da internet para responder às injustiças
Além disso, a internet tem um efeito amplificador que pode ser prejudicial até para quem obtém o direito de resposta.
Como explica Fernando Neisser, presidente da Comissão de Estudos em Direito Político e Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), a publicação de uma resposta nas redes sociais pode alimentar ainda mais o ódio e polarizar o público, levando o ofendido a ser novamente exposto a ataques.
Em outro exemplo, o candidato à prefeitura de Governador Valadares (MG), Renato do Samaritano (Republicanos), acusou uma página no Instagram de divulgar notícias falsas sobre uma infestação de baratas no hospital que leva seu nome.
Apesar da gravidade da acusação, o pedido de direito de resposta foi negado, pois a Procuradoria Regional Eleitoral alegou que o processo exigiria tempo para verificação dos fatos, algo inviável no rito acelerado da Justiça Eleitoral.
A disseminação de fake news nas eleições é uma preocupação crescente. Estudos mostram que notícias falsas se espalham 70% mais rápido que informações verdadeiras, o que agrava ainda mais o problema. Além disso, enquanto um post verdadeiro alcança cerca de mil pessoas, uma fake news pode atingir até 100 mil.
Em meio a essa realidade, o número de pedidos de direito de resposta tende a crescer, à medida que as campanhas eleitorais se tornam cada vez mais agressivas. O cenário político polarizado e a facilidade com que informações falsas circulam nas redes sociais colocam em evidência a necessidade de revisão e adaptação da legislação eleitoral para garantir a justiça nas disputas.